segunda-feira, 1 de março de 2021

BOLETIM 2 ANO XVI

A LIBERDADE DE IMPRENSA NO BRASIL E NO MUNDO 

Destaques: Quebra de sigilo da fonte é arquivado mais de dez anos depois. RSF lança campanha “Verdade Nua” no Brasil. Ataques contra jornalistas acontecem em Cuba, Haiti, Colômbia e Peru. Egito liberta comunicador da Al-Jazeera mantido quatro anos preso sem acusação formal.

Notas do Brasil

Vitória (ES) - A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) ingressou em 24 de fevereiro com pedido de habeas corpus na 2ª Vara Criminal de Vitória (ES), com o objetivo de trancar um inquérito policial contra a Folha do ES, aberto a pedido da Procuradora-Geral de Justiça do estado, dentro da chamada Operação Yellow Press. A ABI denuncia o abuso de autoridade, cometido pela Procuradora-Geral de Justiça, bem como a violação à liberdade de expressão contra a Folha ES, por denúncias envolvendo o governo estadual.

São José do Rio Preto (SP) – A quebra do sigilo da fonte do repórter Allan de Abreu, atualmente na revista piauí, foi julgada improcedente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mais de uma década depois da tentativa. Em 2011, quando trabalhava no jornal Diário da Região, de São José do Rio Preto, Allan assinou uma reportagem que continha trechos de escutas captadas pela Polícia Federal sobre a Operação Tamburutaca, revelando um esquema de corrupção em uma delegacia do Ministério do Trabalho na cidade. Após a publicação da matéria, o procurador da República Álvaro Stipp pediu, sem sucesso, que o repórter revelasse sua fonte. Na sequência, solicitou a abertura de um inquérito para chegar à identidade do informante e o indiciamento do jornalista por quebra de sigilo telefônico. Já em 2014, o Ministério Público Federal também solicitou a quebra do sigilo telefônico de Allan e da redação do jornal. O STF tornou definitivos o arquivamento do inquérito e a anulação do indiciamento por quebra de sigilo de comunicação telefônica. Não cabe recurso.

São Paulo (SP) I - O processo movido pelo Templo Planeta do Senhor, grupo cristão, contra a produtora Porta dos Fundos e o canal de streaming Netflix, foi arquivado. Uma ação civil pública cobrava R$ 1 bilhão de indenização da produtora de humor por conta do especial “Se beber, não ceie”, divulgado no final de 2018. O templo errou o nome do programa que queria processar. O programa (o nome correto é “A Primeira Tentação de Cristo”, de 2019) com Fábio Porchat no papel principal, retrata “Jesus Cristo homossexual, que faz uso de chás alucinógenos e que, ainda, tem dúvida quanto ao seu dever como filho de Deus”, fato que incomodou o grupo cristão. O Porta dos Fundos, no entanto, não está livre ainda da perseguição religiosa. A juíza só encerrou o caso por considerar que segue em andamento outra ação movida por outro grupo católico. 

São Paulo (SP) II - A ONG Repórteres sem Fronteiras (RSF), com sede na França, lançou a campanha “A verdade nua” pela defesa do direito à informação confiável no Brasil durante a pandemia de Covid-19. Com a parceria da agência francesa BETC Paris, a mídia está disponível em francês, inglês, espanhol e português. Traz uma fotomontagem do presidente da República sem roupa, coberto apenas por uma placa que informa o número de mortes causadas pela Covid-19 e o número de casos confirmados da doença no país. O objetivo é ressaltar a importância do jornalismo na informação sobre a crise sanitária. A ONG contabiliza 580 ataques contra a mídia brasileira e seus profissionais em 2020. Segundo a RSF, a hostilidade contra a imprensa reflete como o presidente, sua família e apoiadores tentam “desacreditar a imprensa e silenciar jornalistas críticos e independentes, considerados inimigos do Estado”.

Rio de Janeiro (RJ) – A juíza Maria Tereza Donatti, do 4° Juizado Especial Criminal, encerrou inquérito contra os apresentadores William Bonner e Renata Vasconcellos, do Jornal Nacional, da Rede Globo. Os jornalistas eram investigados por crime de desobediência a uma decisão judicial relacionada a publicações que envolvem o caso das “rachadinhas” no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, na Assembleia Legislativa do RJ. Em 2020, a Globo havia sido proibida judicialmente de publicar informações sigilosas sobre o caso que envolve o atual senador Flávio Bolsonaro (Republicanos), e seu ex-assessor Fabrício Queiroz. Na decisão, a magistrada destacou a necessidade de “restaurar a normalidade e resguardar o livre exercício da imprensa”. A juíza também criticou a conduta do delegado responsável pelo inquérito, Pablo Dacosta Sartori. Segundo ela, mesmo que os apresentadores tivessem cometido crime de desobediência, não cabia à Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes de Informática apurar o caso. 

São Paulo (SP) III – A revista CartaCapital e o jornalista e advogado Brenno Tardelli devem indenizar a apresentadora Luciana Gimenez em R$ 30 mil, devido a um artigo que a associava ao fascismo. A sentença do juiz Fernando José Cúnico, da 12ª Vara do Foro Central Cível, alega que o conteúdo extrapolou os limites da liberdade de expressão. O texto “Calling Jagger to fight fascism”, assinado por Tardelli, foi publicado em maio de 2019 e sugeria que o cantor britânico Mick Jagger interviesse na educação de seu filho com Luciana, pois ela estaria defendendo medidas do governo federal “fascista”. A apresentadora considerou que a matéria violava sua honra e acionou a Justiça. Ainda cabe recurso.

São Paulo (SP) IV - O site Jornal da Cidade Online foi condenado pela juíza Luciana Bassi de Melo, da 5ª Vara Cível de SP, a conceder direito de resposta à rede Band por uma publicação em que acusava a rede de emissoras de ter sido “comprada pelo partido comunista chinês”. A magistrada reconheceu que a publicação extrapolou os limites legais da liberdade de manifestação e de imprensa. A emissora ajuizou a ação alegando que a publicação continha conteúdo inverídico e desabonador em seu prejuízo, a ensejar a concessão do direito de resposta. Conforme a sentença, o site deve conceder direito de resposta à Band, na mesma publicação da matéria objeto da ação, no início ou no final da gravação. 

Brasília (DF) I – A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e diversas outras entidades representativas de profissionais e empresas de comunicação protestaram contra a mudança de local do Comitê de Imprensa da Câmara dos Deputado. Localizado ao lado do plenário de votações da Casa desde a década de 60, com 54 mesas de trabalho e cabines para gravações de áudio, o espaço tinha 288 metros quadrados, facilitando o trabalho dos jornalistas e o acesso aos parlamentares. Inicialmente, a intenção da presidência da Casa era transferir os comunicadores credenciados na Casa para um espaço no subsolo do prédio. Depois, em conversas com os profissionais, encontrou um meio termo, com um novo espaço, mesmo assim longe do plenário e bem menor que o atual, sem as cabines que são usadas pelas emissoras de rádio e TVs para gravações e entrevistas.

Cuiabá (MT) - O jornalista Alexandre Aprá, diretor do site independente Isso É Notícia, criado em 2013 para produzir reportagens investigativas no MT, desde 2019 busca conhecer, via Lei de Acesso à Informação (LAI), quais os gastos de todos os órgãos públicos do Estado com publicidade e propaganda. A Secretaria de Comunicação do Estado se recusou a mostrar em quais veículos de comunicação são aplicados os R$ 70 milhões por ano. O repórter impetrou um mandado de segurança contra a decisão. O Tribunal de Justiça do MT já formou maioria de desembargadores contra o fornecimento da informação pública, inclusive com parecer favorável do Ministério Público Estadual. Os magistrados concordaram com a manifestação da Procuradoria Geral do Estado de que o governo não sabe em detalhes para onde vai a verba para publicidade, papel que cabe às agências contratadas. Pedido de vistas do desembargador Luiz Carlos da Costa adiou a votação para o início de março. Aprá já adiantou que deve recorrer ao STF. 

Brasília (DF) II – O site Brasil 247 e o professor de ciência política da UnB (Universidade de Brasília) Luis Felipe Miguel se livraram de indenizar o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub. Em 16 de janeiro de 2020, um texto do professor foi publicado no site em que ele chamou Weintraub de “desqualificado para o cargo”, citando erros gramaticais cometidos pelo ex-ministro. Weintraub, então, ajuizou a ação e pediu a retirada do texto do ar. Em primeiro grau, a ação foi julgada improcedente. Ele recorreu ao TJ-SP, mas, por unanimidade, a sentença foi mantida. 

Rio Branco (AC) - A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas do AC (Sinjac) manifestaram repúdio contra a demissão do jornalista João Renato Jácome de Andrade, que ocupava a Chefia de Gabinete da Secretaria de Meio Ambiente da cidade, publicada na edição do Diário Oficial do Acre de 26 de fevereiro. O motivo foi o jornalista ter perguntado ao político, durante coletiva, qual a avaliação dele sobre a anulação de quebra de sigilo fiscal de seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), sobre o caso das ‘rachadinhas’, investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro. O presidente não respondeu e imediatamente encerrou a entrevista, se retirando do local. 

Pelo mundo

Cuba - O Instituto Cubano por la Libertad de Expresión y Prensa (ICLEP) denuncia 38 violações contra a liberdade de imprensa no país em janeiro de 2021, um aumento de 124% em comparação com o mesmo mês de 2020. Em parte, a disparada dos casos pode ser atribuída à repressão de uma manifestação em 27 de janeiro, mas jornalistas e organizações sociais acreditam que os ataques à imprensa são parte de uma escalada mais ampla de agressões e devem continuar ao longo do ano. Em 27 de janeiro, jornalistas, ativistas e artistas se concentraram diante do Ministério da Cultura, após uma atividade em homenagem ao 168 aniversário do herói da independência José Martí. Os manifestantes buscavam dialogar com o ministro da Cultura, Alpidio Alonso, e protestar contra as detenções de membros do grupo, que tinham acontecido ao longo do dia. Alonso deu um tapa no celular do jornalista independente Mauricio Mendoza, que gravava a concentração. Em seguida, integrantes do ministério e policiais agrediram fisicamente e detiveram jornalistas e artistas que estavam no local, afirmou o ICLEP. Ao menos cinco jornalistas foram detidos nesse incidente, segundo a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP).

Haiti - A polícia disparou gás lacrimogêneo contra centenas de manifestantes que protestavam contra o presidente Jovenel Moise em Porto Príncipe em 10 de fevereiro e atacaram jornalistas que cobriam a manifestação nos últimos confrontos da crise política que sacode o país. Em 8 de fevereiro, na área de Champs-des-Mars, atacantes não identificados dispararam contra os jornalistas Destiné Alvarez e Jeanril Méus enquanto cobriam protestos. 

Egito – O jornalista Mahmoud Hussein, da rede Al-Jazeera, foi libertado em 4 de fevereiro após mais de quatro anos de prisão, sob a acusação de "divulgar informações falsas". Ele estava em prisão provisória desde dezembro de 2016. A Al-Jazeera denunciou em várias ocasiões a detenção de Hussein sem acusação formal, processo ou condenação. A emissora afirmou que ele sofria "física e mentalmente por esta detenção arbitrária".

Colômbia – A Fundação para a Liberdade de Imprensa (FLIP) revela que os casos de agressão contra jornalistas voltaram a ser um problema grave no país, que hoje é o terceiro mais perigoso para a imprensa nas Américas, atrás somente do México e de Honduras. Desde a assinatura do acordo de paz com a ex-guerrilha das Farc, em 2016, as ameaças, os homicídios, os deslocamentos e o exílio forçado se intensificaram entre os profissionais de imprensa do país "de forma significativa", com um total de 1.013 agressões e oito assassinatos. Somente em 2020, houve dois assassinatos de jornalistas na Colômbia. As vítimas foram Abelardo Liz e Felipe Guevara. As principais violações à liberdade de imprensa foram ameaças (152), obstrução ao trabalho jornalístico (44), agressões físicas (30) e estigmatização (19).

França - A ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) se juntou a uma coalizão de entidades de liberdade de imprensa, liberdades civis e direitos humanos internacionais para solicitar ao Departamento de Justiça dos EUA que não recorra da decisão que rejeitou a extradição de Julian Assange e retire as acusações contra o fundador do Wikileaks. No abaixo-assinado enviado em 8 de fevereiro, as organizações se mostram preocupadas com a repercussão que os processos em andamento contra Assange pode gerar. O texto afirma que as organizações discordam das acusações, mas acima disso, acreditam que os processos representam “grave ameaça à liberdade de imprensa nos EUA e no exterior”. Assinam a nota Artigo19, Associação Mundial de Jornais (Wan-Ifra), Centro Europeu para a Liberdade de Imprensa e dos Meios de Comunicação (ECPMF), Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), Federação Europeia de Jornalistas (EFJ), Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH), Federação Internacional de Jornalistas (FIJ), Global Forum for Media Development (GFMD), International Freedom of Expression Exchange (IFEX), Index on Censorship, International Media Support (IMS), International Press Institute (IPI), Media Foundation for West Africa (MFWA), PEN America, PEN International e Repórteres sem Fronteiras (RSF). 

África do Sul - A Federação Internacional de Jornalistas (FIJ) e a Federação de Jornalistas Africanos, em parceria com a Unesco, União Africana, ONGs e organizações patronais, lançaram uma nova plataforma para divulgar alertas e denúncias de ataque a jornalistas, violação do direito de informar, assédio digital e todo tipo de violação de direitos. A plataforma tem o objetivo de promover a segurança de jornalistas na África e acabar com a impunidade de crimes cometidos contra jornalistas. Desde 1990, 467 jornalistas foram assassinados no continente e até 31 de dezembro de 2020, 62 permaneciam presos, de acordo com a FIJ.

Peru - Mais de 70 jornalistas se manifestaram contra a criminalização judicial da liberdade de informação que existe no Peru e contra as correntes que apontam a imprensa como 'inimiga do povo'. Entre os repetidos ataques contra a imprensa, denúncias legais, difamações baseadas em informações falsas e teorias de conspiração se tornaram as formas mais comuns de ataque. Alguns dos casos citados como exemplo são os dos jornalistas Paola Ugaz, Pedro Salinas e Daniel Yovera, que realizaram investigações sobre o grupo católico Sodalicium.

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A Associação Riograndense de Imprensa (www.ari.org.br) disponibiliza o correio eletrônico imprensalivre@ari.org.br aos profissionais e estudantes da comunicação social para as denúncias envolvendo atentados ao livre exercício da profissão de jornalista.

O programa Conversa de Jornalista, transmitido aos sábados pela Rádio da Universidade AM 1080 Mhz, de Porto Alegre (RS), apresenta a resenha das ocorrências nacionais e internacionais sobre liberdade de imprensa e expressão.

Fontes: ARI (www.ari.org.br), ABI (www.abi.org.br), Fenaj (www.fenaj.org.br), ANJ (www.anj.org.br), Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br), Abert (www.abert.org.br), Abraji (www.abraji.org.br), Portal Imprensa (www.portalimprensa.com.br), Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa (www.liberdadedeimprensa.org.br), Portal Coletiva (www.coletiva.net), Consultor Jurídico (www.conjur.com.br), Sociedade Interamericana de Imprensa (Miami), Federação Internacional deJornalistas (www.ifj.org) (Bruxelas), Sindicato dos Jornalistas de Portugal (www.jornalistas.eu)(Lisboa), ONG Repórteres Sem Fronteiras (www.rsf.org) (Paris), Portal Comunique-se (portal.comunique-se.com.br), Comitê de Proteção aos Jornalistas (Nova Iorque), Centro Knight para o Jornalismo nas Américas (knightcenter.utexas.edu), ONG Campanha Emblema de Imprensa (PEC), Freedom House (www.freedomhouse.org), Associação Mundial de Jornais (www.wan-ifra.org), Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA) (http://www.oas.org/pt/cidh/), Fórum Mundial dos Editores e outras instituições e entidades de defesa do livre exercício da profissão de jornalista.

Pesquisa e edição: Vilson Antonio Romero (RS)


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