quarta-feira, 30 de novembro de 2022

BOLETIM 11 - ANO XVII - NOVEMBRO DE 2022

 A LIBERDADE DE IMPRENSA NO BRASIL E NO MUNDO

Destaques: Entidades registram dezenas de agressões e ameaças a jornalistas em todo o país. Justiça goiana condena assassinos de radialista. Centenas de profissionais são impedidos de acessar o Twitter de políticos e autoridades. Fotógrafo perde a vida no Equador. Rede Voces del Sur denuncia ocorrências contra a liberdade de imprensa.

NOTAS DO BRASIL

Resende (RJ) - Um repórter e uma cinegrafista do Uol Notícias foram xingados e agredidos em 25 de novembro ao tentarem entrevistar manifestantes acampados defronte à Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). Os profissionais foram cercados, ameaçados e tiveram um celular arrancado da mão da cinegrafista que ficou com edema e inchaço no local. O ataque ocorreu mesmo com um destacamento da Polícia do Exército fazendo a proteção dos jornalistas. Ambos necessitaram de escolta para entrarem no carro, que foi acompanhado por uma dupla de militares. Os manifestantes os seguiram em seus veículos até alguma distância do local. Um boletim de ocorrência foi registrado por ameaça, injúria e lesão corporal. Nenhum dos agressores foi ainda identificado.

Cuiabá (MT) - A jornalista Deisy Boroviec, também servidora da Assembleia Legislativa, em 21 de novembro, recebeu ameaças de morte no seu perfil no Facebook feitas por um eleitor de atual presidente da República. O homem acusou-a de disparar “fake news” e usar a “máquina estatal” para difamar o candidato derrotado: “A tua batata está assando, mocreia petista. O meu grupo aí em Cuiabá já sabe onde você trabalha e o teu horário. Toma cuidado que acidentes e roubos toda hora acontecem. Onde você mora sempre olhe para os dois lados da rua! Quer continuar difamando o presidente, vaza então para Bahia, ou Ceará, que é lugar de vagabundos, socialista metida a intelectual”.

Manaus (AM) - Jornalistas do site Radar Amazônico estão sofrendo represálias por parte da gestão do prefeito da cidade, David Almeida (Avante) que teria ameaçado banir o veículo de coletivas da gestão municipal. O político também mostrou a foto de um repórter do portal junto com um adversário político, como forma de deslegitimar seu trabalho jornalístico. As represálias teriam aumentado depois da reprodução pelo Radar Amazônico de uma reportagem do portal Metrópoles, de Brasília, levantando suspeitas de que a campanha de Almeida destinou, em 2020, R$ 70 mil à facção criminosa Comando Vermelho em troca de apoio político. Durante coletiva em outubro, Almeida negou envolvimento no caso e afirmou que processaria os envolvidos na denúncia. Foi nessa ocasião que, ao ser perguntado a respeito pelo repórter Adriano Santos, do Radar Amazônico, o prefeito mostrou uma foto do jornalista com o adversário político Eduardo Braga (MDB) e chamou o jornalista de “teleguiado”. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas do AM criticaram a atitude do prefeito e a tentativa de intimidação ao repórter do Radar Amazônico.

Boa Vista (RR) – Um profissional do portal g1 foi obrigado por um policial civil a apagar vídeos que havia feito sobre a prisão de policiais penais flagrados em um carro com placa adulterada na tarde de 17 de novembro. O repórter estava acompanhado da equipe da TV Rede Amazônica quando foi registrar a condução dos policiais presos e foi intimidado pelo agente no 5º Distrito Policial, zona oeste da cidade. Na ação, o agente segurou o repórter pelo braço, ordenou que ele parasse de filmar e mandou excluir as imagens da galeria e, também da lixeira, do aparelho celular. Temendo por sua integridade, o jornalista assim o fez. Em nota, a Polícia Civil lamentou o ocorrido, mas justificou que a conduta do policial se deu em razão da lei de abuso de autoridade, que impede a coleta de imagens de presos, sendo o dever do policial “resguardar a imagem de todas as pessoas conduzidas às unidades policiais”. A Lei nº 13.869 refere-se somente a agentes públicos. Em nota, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de RR (Sinjoper) repudiou a ação do policial e cobrou do governo “ações enérgicas contra a conduta do policial”.

Niterói (RJ) - O repórter Erick Rianelli, da rede Globo, foi agredido pela defensora pública aposentada Cláudia Barrozo, em 17 de novembro, conforme vídeo que repercutiu nas redes sociais. A mulher, denunciada por racismo contra dois entregadores, se descontrola ao perceber que está sendo filmada por Rianelli e Raoni Alves, repórter do portal g1. Irritada, a filha da agressora se aproxima e derruba o aparelho celular da mão do profissional. “Não pode filmar”, grita. Ao vê-lo pegar o aparelho novamente, Cláudia se aproxima de forma agressiva para que ele não consiga filmá-la. “Você acha isso correto? Você acha correto bater no rosto das pessoas e quebrar os óculos das pessoas?”, questiona Rianelli, que ficou ferido no nariz após o episódio. Enquanto o jornalista conversa com a filha da aposentada, Alves continua com a gravação, na qual Cláudia ainda parece com o rosto coberto e tenta chutar o repórter do g1, mas não chega a atingi-lo.

São Paulo (SP) I - A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) atualizou os dados do monitoramento de jornalistas bloqueados por autoridades públicas no Twitter, projeto que realiza desde setembro de 2020 com apoio da Open Society Foundations. Até 11 de novembro, foram registrados 385 bloqueios a profissionais de imprensa. O monitoramento aponta que ao menos 192 jornalistas de todo o país foram impedidos de acessar as contas de parlamentares, ministros, prefeitos e/ou do presidente da República que segue liderando o ranking, com 104 restrições. Em segundo lugar, está o ex-secretário especial da Cultura, Mário Frias, com 43 “blocks”, seguido do ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, com 42.

São Paulo (SP) II – O Instituto Tornavoz, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) acionaram autoridades federais e estaduais para cobrar mais segurança e investigação da autoria dos ataques a profissionais do jornalismo. As agressões têm aumentado durante a cobertura das manifestações contra o resultado das eleições para presidente da República, em todo o país. Os documentos estão sendo remetidos às autoridades locais e regionais de todos os estados onde foram registrados ataques, como Ministério Público, Secretaria de Segurança Pública e Superintendência Regional da Polícia Federal. Foram 54 ofícios a 18 estados, nos quais Abraji e as demais organizações alertam para o crescimento da violência política, potencializada pelo discurso radicalizado da eleição. Um levantamento feito pela Abraji em parceria com a Fenaj mostra que, desde 30 de outubro, quando se deu o resultado eleitoral, até 23 de novembro, foram registrados 64 episódios que envolveram agressão física, ameaças de morte, expulsão de equipes dos locais públicos onde se davam os protestos e até um atentado a tiros contra a redação de um site.

Porto Velho (RO) – O prédio do site de notícias Rondônia ao Vivo teve janelas e portas perfuradas por disparos de arma de fogo na madrugada de 12 de novembro. Uma câmera de segurança registrou um homem se aproximando e disparando contra o local. Ninguém ficou ferido pois o imóvel estava vazio na ocasião. O dono do site, Paulo Andreoli, informou que os policiais encontraram 19 cápsulas de pistola 9 mm em frente ao imóvel. Ele imagina que o ataque tenha relação com grupos políticos radicais da cidade.

Brasília (DF) – Um repórter e um fotógrafo do Correio Braziliense foram ameaçados na tarde de 11 de novembro por manifestantes que protestavam contra o resultado das eleições em frente ao QG do Exército. A equipe foi ao local para registrar a saída de parte dos caminhoneiros que estacionaram os veículos na região. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF repudiou o cerceamento ao livre exercício da profissão.

Goiânia (GO) - Quatro dos cinco acusados pelo homicídio do radialista Valério Luiz foram condenados em 9 de novembro. O profissional foi assassinado a tiros em cinco de julho de 2012, ao sair da rádio 820 AM em que trabalhava. O inquérito policial, assim como a denúncia feita pelo Ministério Público em fevereiro de 2013, apontavam que a motivação do crime foram críticas constantes de Valério ao time de futebol Atlético - GO. À época, o time tinha como vice-presidente Maurício Sampaio, que confirmou sua inimizade com o radialista em entrevistas e espaços públicos. Os cinco acusados se tornaram réus em março de 2013, e a pronúncia ocorreu em agosto de 2014. Foram condenados o açougueiro Marcos Vinícius Xavier, acusado de auxiliar no planejamento do homicídio, a 14 anos de reclusão; o cabo da Polícia Militar Ademá Aguiar Filho, autor dos disparos, a 16 anos de reclusão; Maurício Borges Sampaio, ex-presidente do Atlético – GO, mandante do assassinato, a 16 anos de reclusão, e Urbano Malta, que era funcionário de Maurício e responsável pela contratação de Ademá, a 14 anos de reclusão. O sargento reformado da Polícia Militar Djalma Gomes da Silva, foi absolvido.

Porto Alegre (RS) - O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS e a Associação Riograndense de Imprensa (ARI) divulgaram notas em 2 de novembro protestando contra as hostilidades e cerceamento da atividade que profissionais têm sofrido na capital gaúcha. Mencionaram ocorrências envolvendo equipes da TV Bandeirantes, Record TV RS e do SBT no Centro Histórico da cidade. A equipe do repórter Matheus Goulart, da TV Bandeirantes, foi atacada a socos por um dos manifestantes. A repórter Daiane Dalle Tese, o cinegrafista Adilson Corrêa e o auxiliar Flávio dos Santos, da Record TV RS, foram intimidados e impedidos de trabalhar. O repórter Lucas Abati e o cinegrafista Cristiano Mazoni, do SBT, foram hostilizados ao serem cercados por manifestantes, que os fizeram abandonar a cobertura.

PELO MUNDO

Equador - O fotógrafo autônomo Henry Vivanco foi encontrado morto em 14 de novembro, com sinais de tortura em uma casa em Huarquillas, na região sul do país. O corpo estava algemado, seminu, de face para baixo e com sinais de violência. Vivanco era conhecido por seu trabalho fotográfico e como cronista e jurado de vários eventos de beleza.

México – A ONG Artigo 19 exigiu justiça para os 156 jornalistas assassinados em território mexicano nos últimos 22 anos. A organização lançou, no início de novembro, uma campanha para exigir que termine a impunidade dos crimes. As mensagens ressaltam que ”ser jornalista é um trabalho em que você arrisca sua vida todos os dias. Quando pensamos em profissões de risco, vêm à mente aquelas em que você arrisca sua vida: bombeiros, soldados, socorristas, policiais. Muitas, exceto o jornalismo.”

Bolívia – O jornalista Yerko Guevara, da Unitel, foi agredido em 11 de novembro por dirigentes sindicais que promoviam manifestações e bloqueios na capital do departamento de Santa Cruz. Grupos supostamente relacionados ao Movimento Al Socialismo (MAS) atacaram outros repórteres e cinegrafistas, destruíram equipamentos e queimaram pneus na sede da Câmara de Indústria, Comércio, Serviços e Turismo de Santa Cruz (Cainco).

Argentina – A rede Voces del Sur registrou no Relatório Sombra do ano passado, divulgado originalmente em espanhol em 6 de setembro, 4.931 alertas de violações às liberdades de expressão e de imprensa e ao direito de acesso à informação em 14 países da América Latina. Em 2021, foram identificados, em média, 14 alertas por dia, ou seja, um a cada duas horas. A Abraji disponibilizou em 30 de novembro o documento traduzido para o português em seu site no endereço https://www.abraji.org.br/publicacoes/relatorio-sombra-2021-portugues.

Itália – O jornalista e escritor Roberto Saviano está sendo processado por difamação pela primeira-ministra Giorgia Meloni, por conta de uma declaração feita em dezembro de 2020. Na ocasião, Saviano criticou Meloni e seu vice Matteo Salvini, ao comentar a morte de um bebê africano de seis meses em um barco de refugiados que foi proibido de atracar na Itália: “Só posso dizer a Meloni e Salvini: desgraçados! Como eles podem fazer algo assim?”. Autor do livro “Gomorra”, reportagem investigativa sobre a máfia napolitana que vendeu milhões de exemplares e foi adaptada para o cinema e para a TV, Saviano pode enfrentar até três anos de prisão se for condenado. Organizações em defesa das liberdades de imprensa e de expressão, como a PEN International e a OSCE (Organization for Security and Co-operation in Europe), exigiram que a primeira-ministra retire as acusações, sob risco de constranger outros jornalistas e escritores.

EUA - O governo do presidente Joe Biden garantiu imunidade ao príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, no processo movido contra ele pela noiva do jornalista Jamal Khashoggi, que foi torturado, assassinado e esquartejado em 2018, na Turquia, a mando do líder saudita. A determinação do governo Biden resulta de um processo judicial movido por advogados do Departamento de Justiça, a pedido do Departamento de Estado americano. A ação alega que bin Salman foi nomeado primeiro-ministro saudita, ganhando imunidade como chefe de governo estrangeiro. Hatice Cengiz, noiva de Khashoggi, e a ONG DAWN, de direitos humanos, com sede em Washington, fundada pelo jornalista, moveram processo contra bin Salman e outras 28 pessoas, em outubro de 2020, no Tribunal Distrital Federal. Publicado em fevereiro de 2021, quando Biden assumiu a presidência dos EUA, um relatório de agentes de inteligência americanos sobre o assassinato afirmava que bin Salman aprovou a operação para capturar e matar o jornalista. As investigações sobre o crime apontam que uma equipe saudita de 15 pessoas foi enviada a Istambul em outubro de 2018 para matá-lo.  Ainda segundo as investigações, bin Salman via Khashoggi como uma ameaça à Arábia Saudita.

China - O Clube de Correspondentes Estrangeiros da China (FCCC) divulgou em 28 de novembro manifestação reprovando o tratamento dado aos jornalistas que cobrem os recentes protestos em Xangai e Pequim. Há registro de agressões e pelo menos duas detenções desde que os protestos contra o governo se intensificaram nos últimos dias. O caso de maior repercussão internacional foi o do jornalista Edward Laurence, da britânica BBC. Ele foi jogado no chão, espancado e ficou detido por várias horas. O mesmo aconteceu com Michael Peuker, da Radio Telévision Suisse.

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A Associação Riograndense de Imprensa (www.ari.org.br) disponibiliza o correio eletrônico imprensalivre@ari.org.br aos profissionais e estudantes da comunicação social para as denúncias envolvendo atentados ao livre exercício da profissão de jornalista.

Fontes: ARI (www.ari.org.br), ABI (www.abi.org.br), Fenaj (www.fenaj.org.br), ANJ (www.anj.org.br), Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br), Abert (www.abert.org.br), Abraji (www.abraji.org.br), Portal Imprensa (www.portalimprensa.com.br), Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa (www.liberdadedeimprensa.org.br), Portal Coletiva (www.coletiva.net), Portal dos Jornalistas (https://www.portaldosjornalistas.com.br/), Jornalistas & Cia (https://www.jornalistasecia.com.br/),  https://mediatalks.uol.com.br, Consultor Jurídico (https://www.conjur.com.br/areas/imprensa), Sociedade Interamericana de Imprensa (Miami), Federação Internacional de Jornalistas (www.ifj.org) (Bruxelas), Sindicato dos Jornalistas de Portugal (www.jornalistas.eu)(Lisboa), ONG Repórteres Sem Fronteiras (www.rsf.org) (Paris), Portal Comunique-se (portal.comunique-se.com.br), Comitê de Proteção aos Jornalistas (Nova Iorque), Centro Knight para o Jornalismo nas Américas (knightcenter.utexas.edu), ONG Campanha Emblema de Imprensa (PEC), Freedom House (www.freedomhouse.org), Associação Mundial de Jornais (www.wan-ifra.org), Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) (http://www.oas.org/pt/cidh/), Fórum Mundial dos Editores, https://forbiddenstories.org/, https://www.mfrr.eu/, https://www.onefreepresscoalition.com/press e outras instituições e entidades de defesa do livre exercício da profissão de jornalista.

Pesquisa e edição: Vilson Antonio Romero (RS)

vilsonromero@yahoo.com.br

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