segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

BOLETIM 1 ANO XVII - JANEIRO DE 2022

 A LIBERDADE DE IMPRENSA NO BRASIL E NO MUNDO

Destaques: Fenaj denuncia mais de 400 ataques à imprensa em 2021. Gilmar Mendes derruba censura prévia à RBS TV. Rosa Weber, do STF, aciona Presidência da República sobre assédios a jornalistas. México inicia o ano com três assassinatos de jornalistas. Julian Assange ainda pode recorrer à Suprema Corte no Reino Unido.

NOTAS DO BRASIL

Porto Alegre (RS) - A RBS TV obteve autorização judicial para publicar reportagem do repórter Giovani Grizotti sobre investigação do Ministério Público contra o prefeito de Bagé, Divaldo Lara (PTB). O político havia sido denunciado em dezembro de 2020 por supostas fraudes. A reportagem foi proibida de ir ao ar em agosto de 2021, em razão de duas decisões judiciais, suspensas em 11 de janeiro por liminar do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Na decisão, o ministro entendeu que obter informações sigilosas da investigação não implica em ato ilícito da RBS TV nem do autor da reportagem. Mendes também sustentou não haver legitimação para a interferência do Poder Judiciário na divulgação do trabalho jornalístico. A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) repudiou os ataques posteriores do prefeito contra o repórter da RBS, divulgando um vídeo e colocando a segurança do profissional em risco. 

Garibaldi (RS) - O apresentador Daniel Carniel, da Adesso TV, foi agredido com socos e chutes na tarde de 14 de janeiro, quando chegava à sede da emissora. Mesmo ensanguentado, o âncora entrou no ar para denunciar a agressão motivada, provavelmente, por uma denúncia política feita no programa NaTelinha. A polícia já identificou um suspeito. Entidades de classe repudiaram o ataque.

Brasília (DF) I – A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) denunciou 430 agressões a jornalistas e a veículos de comunicação, no Relatório da Violência Contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil – 2021, divulgado em 27 de janeiro. A Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e dos Direitos Humanos da ABI esteve representada na coletiva pelo conselheiro Vilson Antonio Romero (RS). Segundo o documento, o presidente da República, assim como no ano anterior, foi o principal agressor. O mandatário foi responsável por 147 casos (34,19% do total), sendo 129 episódios de descredibilização da imprensa e 18 de agressões verbais a jornalistas. O relatório traz, em detalhes, os números gerais das violações à liberdade de imprensa e as análises feitas pela entidade, com a classificação dos ataques por categoria (de assassinatos a cerceamentos por meio de ações judiciais), regiões/estados, gênero e tipos de mídia, além da apresentação dos agressores. A edição tem o apoio institucional do Fundo de Direitos Humanos da Embaixada do Reino dos Países Baixos.

São Paulo (SP) I - 89 jornalistas e meios de comunicação foram alvos de 119 ataques de gênero relacionados à profissão, em 2021, o que representa quase 10 casos de agressões, ofensas, ameaças e intimidações por mês. Resultado do monitoramento da violência de gênero contra jornalistas, feito pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), os dados incluem ataques envolvendo identidade de gênero, sexualidade, orientação sexual, aparência e estereótipos sexistas, bem como episódios de agressão contra mulheres comunicadoras – cis ou trans – de forma geral. As informações estão disponíveis na plataforma on-line do projeto patrocinado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

São Paulo (SP) II – A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) revelou que, dos 315 bloqueios no Twitter contra profissionais de imprensa de setembro de 2020 a janeiro de 2022, 291 foram realizados pelo presidente da República, seus filhos com mandatos eletivos, ministros e secretários especiais de Estado, além de parlamentares de sua base de apoio. Em tutorial publicado no YouTube, a gigante da tecnologia afirma que o bloqueio pode ser usado por usuários para evitar ver postagens rudes, maldosas, sem senso, inadequadas ou perturbadoras. Jornalistas ouvidos pela Abraji afirmaram que foram bloqueados por criticar o presidente, por sua atuação como profissional de imprensa ou sequer sabem o motivo da represália. 

Brasília (DF) II - A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu informações à Presidência da República e ao Congresso Nacional em razão de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizada pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) que questiona o chamado “assédio judicial” contra jornalistas. Da mesma forma, solicitou pronunciamento da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Procuradoria-Geral da República (PGR). A ação foi distribuída, por prevenção, à Rosa Weber, que já é relatora de outra ação em que a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) contesta o emprego abusivo de ações judiciais de reparação de danos materiais e morais com o intuito de impedir a atuação livre de jornalistas e órgãos de imprensa. 

Brasília (DF) III - O apresentador William Bonner, da Rede Globo, se livrou do mandado de segurança cível impetrado pelo advogado Wilson Koressawa porque teria cometido o “crime” de publicamente defender a imunização contra a pandemia. A juíza Gláucia Foley, do Juizado Especial Criminal de Taguatinga, definiu o caso como proveniente de “delírios negacionistas”. Além da detenção do titular do programa Jornal Nacional, Koressawa pedia a suspensão da obrigatoriedade da vacinação contra o coronavírus, “principalmente de crianças e adolescentes”. A juíza observou que somente o Ministério Público (MP) poderia solicitar a prisão de alguém pelos crimes elencados na ação, além de definir o caso como movido a partir de “teorias conspiratórias, sem qualquer lastro científico e jurídico, sendo mera panfletagem política”. 

Recife (PE) - O jornalista Reinaldo Azevedo, atualmente na Band News FM e jornal Folha de S.Paulo, se livrou de indenizar o senador Humberto Costa (PT-PE) por publicações na revista Veja em 2011. A Seção B da 11ª Vara Cível de Recife negou provimento à ação ajuizada pelo político por não constatar conteúdo vexatório capaz de atingir a honra e a reputação do autor. Os textos de Azevedo criticavam a disputa entre o PT e o PMDB (atual MDB) por cargos na Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e outras ações do início do governo da então presidente Dilma Rousseff. Nos trechos apontados pelo autor, o jornalista disse que o PT “instituiu o baguncismo na Funasa”. Também afirmou que, em 2003, quando Humberto era ministro da Saúde, ele e o então presidente Lula “abriram as portas para a sem-vergonhice” ao permitirem o “loteamento político da fundação”. Para o juiz Marcus Rabelo Torres, as publicações teriam apenas um teor irônico e ácido: “O que se verifica são opiniões políticas, críticas às alterações promovidas na Funasa, para as quais contribuiu o autor, responsável pela elaboração de um decreto fundamental para as mudanças que são alvo das publicações, de modo que a menção a seu nome nos artigos é completamente compreensível”. 

São Paulo (SP) III - O jornalista Germano Oliveira, da revista IstoÉ, foi absolvido na queixa-crime impetrada pelo presidente da Federação das Indústrias do RJ (Firjan), Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira. A juíza Roberta Domingues, da Vara Criminal da Lapa, entendeu que publicar trabalho jornalístico com críticas contundentes a uma pessoa com base em documentos e fatos notórios não configura a prática de crimes contra a honra. A ação teve origem em duas reportagens de 2019 na versão digital da revista intituladas “Caiu na Lava Jato” e “Monarca ou Déspota”. No primeiro texto, o autor afirma que o atual ministro da Economia “escolheu um aliado enrolado com a Justiça e o MPF para assessorá-lo no Serviço Social da Indústria” e que procuradores estavam intrigados com as movimentações patrimoniais atípicas de Vieira. No segundo texto, o jornalista afirma que Eduardo Vieira é conhecido como “monarca” e acumularia um “reinado de 24 anos” no comando da Firjan.

São Paulo (SP) IV – As redes Band e Record foram condenadas a indenizar Claudinei Cordeiro que teve sua imagem vinculada, de forma equivocada, ao homicídio de uma criança. A 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de SP, em decisão unânime, manteve a sentença de primeira instância, pois entendeu ter havido ofensa à honra pela utilização em 2020 da imagem sem autorização. Cada emissora terá que pagar ao autor uma indenização por danos morais de R$ 50 mil. Apesar de ter sido fixada, em primeiro grau, uma multa de R$ 10 mil em caso de não exclusão da imagem do autor em um vídeo disponível no Youtube do programa Brasil Urgente, a Band manteve o conteúdo na plataforma, descumprindo a liminar. Já a Record retirou a reportagem de todas as suas plataformas.

Porto Alegre (RS) II - O influenciador e blogueiro Felipe Neto se livrou de ação por danos morais ajuizada pelo site Jornal da Cidade Online, apoiador do atual governo federal. O pedido de liminar já havia sido negado anteriormente, mas os responsáveis pelo site recorreram e, em 24 de janeiro, o Tribunal de Justiça do RS indeferiu novamente a ação. Alvo da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPMI) das Fake News no Congresso e de quebra de sigilo autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o veículo disse ter sido prejudicado por supostas notícias falsas veiculadas por Neto em suas redes sociais. Em postagens anexadas ao processo, o comunicador endossou denúncias feita pelo perfil Sleeping Giants, que alerta empresas sobre a divulgação de publicidade em sites que reproduzem conteúdo de ódio ou mentiroso. O portal bolsonarista chegou a perder anunciantes após o surgimento da iniciativa. Afirmando ter sofrido prejuízos financeiros e morais por causa dos compartilhamentos de Felipe Neto, o jornal pediu uma indenização de R$ 100 mil e a exclusão das publicações, além de retratação pública.

PELO MUNDO

México – Os jornalistas iniciaram em 25 de janeiro um protesto nacional para denunciar os assassinatos recentes de três profissionais, exigindo o fim da impunidade. As manifestações se seguiram ao assassinato da jornalista Lourdes Maldonado, cerca de três anos depois que ela levou o assunto ao presidente Andrés Obrador, e disse temer por sua vida. Maldonado foi assassinada na noite de 23 de janeiro, em Tijuana, na Baixa Califórnia, dias depois de o fotógrafo veterano Alfonso Margarito Martínez Esquivel ser baleado na porta de casa na mesma cidade. Na semana anterior, José Luis Gamboa Arenas, diretor do diário digital Inforegio, foi esfaqueado em Veracruz. Foi o terceiro assassinato de jornalistas este ano, num dos países mais perigosos do mundo para jornalistas, com 145 assassinatos de profissionais da imprensa entre 2000 e 2021, de acordo com a ONG Artigo 19. 

França - O Senado está realizando uma comissão de inquérito sobre a concentração da mídia com o objetivo de esclarecer como a informação consumida pelos franceses é afetada pelos grandes conglomerados de comunicação.  Um dos focos da investigação é o grupo Bolloré, que há seis anos assumiu a rede Canal Plus e vem sendo acusado por parte dos membros da comissão de manipulação de informações. O senador socialista David Assouline, relator da comissão, disse que as formas de preservar o pluralismo na mídia da França e sancionar violações a essa pluralidade “são muito vagas”. A lei do audiovisual é de 1986 - e para muitos já não garante a liberdade, independência e pluralismo nos meios de comunicação social do país.

Nicarágua - Em 2021, foram registrados 702 casos de abuso de poder e violência contra a imprensa por parte do Estado, quase o dobro dos 360 registrados em 2020. Os dados integram o “Relatório sobre Violações da Liberdade de Imprensa 2021”, elaborado pelo jornal La Prensa e pela organização Voces del Sur. Na lista de vítimas da violência do Estado, os veículos independentes estão em primeiro lugar, com 469 ocorrências. Seguem-se ataques individuais a jornalistas, com 124 casos; e aos editores, diretores e executivos de mídia, com 76 registros. Entre as ocorrências denunciadas está a busca e ocupação policial do jornal La Prensa, ocorrida em 13 de agosto, bem como a busca sem mandado no veículo digital Confidencial, em 20 de maio. Em fevereiro de 2021, funcionários do governo confiscaram as instalações do canal 100% Noticias e as redações do portal Confidencial e da Revista Niú. A organização Voces del Sur considera o uso abusivo do poder estatal como ações que visam a asfixia financeira da mídia, a exclusão dos planos publicitários estatais, a ameaça ou cancelamento de estações de rádio e sanções administrativas e econômicas injustificadas.

Honduras - A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e sua Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão condenam o assassinato do líder indígena e jornalista Pablo Isabel Hernández Rivera e pedem urgência na investigação. Em 9 de janeiro, Rivera, da rádio comunitária Tenán 94.1 FM, foi morto a tiros por desconhecidos quando se dirigia à igreja no município de San Marcos de Caiquín, departamento de Lempira.

Peru - O editor Christopher Acosta, da TV Latina Noticias de Lima, foi condenado a multa e dois anos de prisão junto com o diretor da editora Penguin House, em um processo movido pelo político César Acuña em razão de um livro publicado sobre ele pelo jornalista. O Conselho de Imprensa divulgou um comunicado demonstrando preocupação com a liberdade de expressão no país diante do caso. Acuña entrou com sua ação em resposta ao livro “Plata como cancha: Secretos, impunidad y fortuna de César Acuña”, publicado em fevereiro de 2021 pela Penguin Random House Peru. O político já foi prefeito, governador, deputado federal e concorreu duas vezes à presidência do país, mas não conseguiu se eleger. O livro de Acosta é uma investigação sobre a origem da fortuna do político e de seus atos. Várias fontes identificadas afirmam que Acuña se envolveu em compra de votos, apropriação indébita de fundos públicos e plágio. 

Reino Unido - O Supremo Tribunal decidiu que Julian Assange, fundador do Wikileaks, pode solicitar uma audiência à Suprema Corte para apelar da decisão de dezembro passado que deu aos EUA o direito de extraditá-lo para responder em solo americano pelo vazamento de segredos de guerra do país. Os advogados de Assange têm 14 dias para fazer a solicitação, e não há garantias de que a audiência será concedida. Por enquanto ele continua preso na penitenciária de segurança máxima de Belmarsh, onde se encontra desde 2019, quando foi retirado da embaixada do Equador em Londres.

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A Associação Riograndense de Imprensa (www.ari.org.br) disponibiliza o correio eletrônico imprensalivre@ari.org.br aos profissionais e estudantes da comunicação social para as denúncias envolvendo atentados ao livre exercício da profissão de jornalista.

O programa Conversa de Jornalista, transmitido aos sábados pela Rádio da Universidade AM 1080 Mhz, de Porto Alegre (RS), apresenta a resenha das ocorrências nacionais e internacionais sobre liberdade de imprensa e expressão.

Fontes: ARI (www.ari.org.br), ABI (www.abi.org.br), Fenaj (www.fenaj.org.br), ANJ (www.anj.org.br), Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br), Abert (www.abert.org.br), Abraji (www.abraji.org.br), Portal Imprensa (www.portalimprensa.com.br), Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa (www.liberdadedeimprensa.org.br), Portal Coletiva (www.coletiva.net), Portal dos Jornalistas (https://www.portaldosjornalistas.com.br/), Jornalistas & Cia (https://www.jornalistasecia.com.br/),  https://mediatalks.uol.com.br, Consultor Jurídico (https://www.conjur.com.br/areas/imprensa), Sociedade Interamericana de Imprensa (Miami), Federação Internacional de Jornalistas (www.ifj.org) (Bruxelas), Sindicato dos Jornalistas de Portugal (www.jornalistas.eu)(Lisboa), ONG Repórteres Sem Fronteiras (www.rsf.org) (Paris), Portal Comunique-se (portal.comunique-se.com.br), Comitê de Proteção aos Jornalistas (Nova Iorque), Centro Knight para o Jornalismo nas Américas (knightcenter.utexas.edu), ONG Campanha Emblema de Imprensa (PEC), Freedom House (www.freedomhouse.org), Associação Mundial de Jornais (www.wan-ifra.org), Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) (http://www.oas.org/pt/cidh/), Fórum Mundial dos Editores, https://forbiddenstories.org/, https://www.mfrr.eu/, https://www.onefreepresscoalition.com/press e outras instituições e entidades de defesa do livre exercício da profissão de jornalista.

Pesquisa e edição: Vilson Antonio Romero (RS)

vilsonromero@yahoo.com.br

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