segunda-feira, 31 de agosto de 2020

BOLETIM 8 ANO XV

A LIBERDADE DE IMPRENSA NO BRASIL E NO MUNDO

Destaques: Justiça censura reportagens no RJ, SP e PR. Polícia indicia PMs que agrediram jornalistas no RS. Dezenas de profissionais são presos na Bielorrússia. CPJ pede urgência na apuração de assassinato na Colômbia.

Pelo Brasil

Rio de Janeiro (RJ) - O Jornal GGN teve de retirar do ar uma série de reportagens sobre o Banco BTG Pactual, sob pena de multa diária de R$10 mil em caso de descumprimento. A decisão do juiz Leonardo Grandmasson Chaves, da 32ª Vara Cível, visou matérias dos jornalistas Luís Nassif (chefe de redação) e Patricia Faermann que mencionam contratos suspeitos, a começar por uma licitação supostamente dirigida da Zona Azul da Prefeitura de SP, vencida pelo banco através da empresa Allpark, que pertence ao grupo BTG. Em outro texto, a denúncia cita venda de “créditos podres” do Banco do Brasil para o BTG Pactual. O lucro obtido pelo BTG através de fundos de previdência privada no Chile também foi objeto de reportagem. O magistrado avaliou que as matérias seriam “campanha desmoralizadora, para causar dano à honra objetiva do banco (…) e que transborda os limites da liberdade de expressão”. O Jornal GGN deve recorrer da decisão ao Supremo Tribunal Federal (STF), com o apoio da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e do Instituto Vladimir Herzog. 

Curitiba (PR) - Uma reportagem da revista Quatro Rodas, de 15 de agosto, foi censurada e teve que ser retirada da internet por determinação da juíza Beatriz Moraes, do Tribunal de Justiça do PR, que atendeu pedido da Militec Brasil Importação e Comércio, representante no Brasil do produto Militec-1. A publicação revelou o laudo de um relatório de ensaio feito pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) com a seguinte reportagem: “Militec-1 pode ser corrosivo para o motor e não tinha registro na ANP”. A liminar suspende a veiculação da matéria até o julgamento final do processo. A Editora Abril, que publica Quatro Rodas, avalia recurso contra a censura. 

São Paulo (SP) I - O economista Ricardo Sennes, comentarista da TV Cultura, sofreu diversos ataques e processos por causa de um comentário feito no Jornal da Cultura, em abril, que criticava a medida do presidente da República de revogar portarias do Exército destinadas ao controle de armamentos no Brasil. Colecionadores de armas e caçadores moveram dezenas de ações judiciais contra o comentarista, em campanha articulada através das redes sociais, com o objetivo de fazê-lo gastar dinheiro com advogados e se deslocar para outros municípios em plena pandemia. O juiz Roberto Chiminazzo Júnior, de Campinas (SP), que julgou um dos processos, concluiu que Sennes é vítima de ação “destinada a intimidar e causar despesas e incômodos”. Outro juiz, Daniel Borborema, de São Carlos (SP), disse que o objetivo do processo “é constranger o réu, retaliar e desgastá-lo financeira e emocionalmente”.

São Paulo (SP) II – A Agência Lupa e a Ponte Jornalismo denunciaram que estão sendo vítimas de ataques virtuais. A jornalista Cristina Tardáguila, fundadora da agência de checagem Lupa, afirmou que postagens com informações falsas sobre a criação e o funcionamento da Lupa circulavam no Facebook, no Twitter e no WhatsApp. Já a Ponte Jornalismo informou no Twitter que o seu site saiu do ar porque vem sendo alvo de intensos ataques. Em uma nota oficial, a Lupa explicou que “vem sofrendo uma campanha coordenada de desinformação com viés homofóbico nas redes sociais. Em um post que circulou em 20 de agosto, Gilberto Scofield Jr., diretor de Estratégias e Negócios da Lupa desde maio de 2019, e seu marido, Rodrigo de Mello, corretor de imóveis, foram falsamente apontados como fundadores da agência de checagem, chamados de militantes de esquerda e ativistas LGBT e acusados de censura”. Um dos fundadores e editores da Ponte, Fausto Salvadori, explicou que o site vem enfrentando muita instabilidade há várias semanas. Segundo a empresa responsável pela hospedagem do site, há indícios de estar sendo alvo de ataques de negação de serviços (DDoS). É praticamente impossível rastrear a origem de ataques desse tipo. A Ponte realiza reportagens nas áreas de segurança pública e direitos humanos.

 

São Paulo (SP) III – O jornal Folha de S. Paulo foi condenado em 12 de agosto a indenizar três promotores de Justiça que pediram a prisão preventiva do ex-presidente Lula. A 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de SP entendeu que “os servidores públicos devem se submeter à crítica da sociedade e, consequentemente, da imprensa. No entanto, não sendo a liberdade de imprensa um direito absoluto, não há lugar para excessos e ofensa pessoal”. Em editorial intitulado “Trio de Horrores”, publicado em março de 2016, o jornal critica a atuação dos promotores, dizendo que eles teriam “sede de celebridade” e padeceriam de “ignorância” e “feroz paixão persecutória”. Um dos trechos do editorial menciona que os promotores “tropeçaram em citações risíveis do filósofo Nietzsche — cujo nome grafaram incorretamente e cujo pensamento sem dúvida ignoram — e caíram na já notória esparrela de confundir Hegel com Engels”. Pela decisão, Cássio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo receberão R$ 30 mil, cada um. Ainda cabe recurso.

Brasília (DF) I - A desembargadora Maria Ivatônia dos Santos, do Tribunal de Justiça do DF, manteve a censura imposta à uma reportagem da Crusoé em ação ajuizada pela deputada Bia Kicis (PSL-DF). A reportagem de 17 de julho, da jornalista Helena Mader, mostrava o enfraquecimento do apoio à PEC da Segunda Instância entre os apoiadores do governo federal. A decisão em primeira instância foi do juiz Hilmar Castelo Branco Raposo Filho, da 21ª Vara Cível de Brasília. Ele ordenou a retirada do texto da internet ou a supressão do nome da deputada. A revista optou pela segunda opção, cobrindo o nome da deputada com uma tarja preta enquanto a decisão vigorar.

São Bernardo do Campo (SP) – Um processo do prefeito Orlando Morando (PSDB) contra o ilustrador Luiz Carlos Fernandes, do Diário do Grande ABC, gerou uma reação de chargistas no Brasil e no exterior. A ação criminal pede explicações do ilustrador sobre charge publicada pelo jornal em 19 de julho, que fez menção a uma denúncia feita à Polícia Federal contra Morando. Uma empresa do prefeito é suspeita de comprar imóveis por valor abaixo do avaliado no mercado, o que pode configurar lavagem de dinheiro. O desenho traz a caricatura de Morando com uma placa no pescoço onde estão pintados os dizeres: “Compro terrenos. Dinheiro na hora”. O prefeito disse que poderia ainda processar Fernandes por calúnia e difamação, por ter sido retratado de maneira “jocosa”. O autor da reportagem que revelou o suposto esquema, jornalista Raphael Rocha, também é alvo do processo. Entidades de jornalistas e cartunistas do Brasil e fora do País reagiram à atitude de Morando e classificaram a ação judicial como tentativa de cerceamento da profissão e da liberdade de expressão.

Teresina (PI) – O apresentador Tony Trindade, da TV Band Piauí, foi preso preventivamente pela Polícia Federal em 18 de agosto, sob acusação de atrapalhar investigações de um esquema de desvio de recursos públicos da educação na cidade de União. Em nota, a assessoria o jornalista informou que ele fez apenas o seu dever e que foi preso pela “relação com suas fontes”. Sem dar maiores detalhes, a PF atribuiu a Trindade “atitudes para obtenção de informações sigilosas”, além de “tentativa de intimidação da investigação policial”. Além do jornalista, a operação da PF teve como alvos endereços na capital Teresina e na cidade de Monsenhor Gil, nos quais foram buscadas provas sobre os responsáveis por vazar informações sigilosas sobre as investigações. Os investigados podem responder pelo crime de embaraço à investigação policial de crime praticado por organização criminosa. A pena pode chegar a 8 anos de prisão.

Brasília (DF) II - O julgamento do recurso do fotógrafo Alexandro Silveira no Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) foi suspenso em 14 de agosto por pedido de vistas do ministro Alexandre de Moraes, logo após a manifestação do relator Marco Aurélio de Mello. Em seu despacho, Mello entendeu que “atribuir a culpa exclusiva ao jornalista que foi ferido pela polícia durante a cobertura de um evento inibe a cobertura jornalística e viola o direito ao exercício profissional e o direito-dever de informar”. O repórter fotográfico foi atingido por bala de borracha disparada pela Polícia Militar de SP e perdeu a visão do olho esquerdo, enquanto cobria um protesto de professores na capital paulista em 18 de maio de 2000. No recurso é questionada decisão do Tribunal de Justiça de SP, que admitiu que a bala de borracha da corporação militar foi a causa do ferimento no olho do repórter, com sequela permanente na visão, durante registro de tumulto envolvendo manifestantes grevistas e policiais, mas reformou entendimento do juízo de primeira instância para atribuir a culpa exclusiva à vítima.

Belo Horizonte (MG) - O jornalista Fred Melo Paiva deve indenizar o ex-senador Zezé Perrella em R$ 15 mil pelo tuíte “Lá vai Perrella, sem um votinho, mas com 450 quilos de pasta base”. A 20ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de MG, em 5 de agosto, negou provimento ao recurso de apelação e manteve a sentença condenatória da primeira instância. O tuíte foi publicado quando que o então senador se levantou para votar na sessão do Senado que aprovou o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Ele fazia referência ao fato de Perrella, que assumiu o mandato como suplente do senador Itamar Franco, falecido em 2011, ter tido um helicóptero de sua propriedade apreendido pela Polícia Federal com quase meia tonelada da cocaína. Cabe recurso ao STJ e ao STF.

Alegrete (RS) - A Polícia Civil indiciou dois policiais militares por agressão e abuso de autoridade no caso envolvendo o espancamento de dois profissionais de imprensa. Em 18 de junho, o repórter free lancer Alex Stanrlei e o diretor do jornal Em Questão, Paulo de Tarso Pereira, ficaram feridos depois de serem abordados pela Brigada Militar, ao cobrirem uma ocorrência. Uma aspirante do Exército também foi indiciada por omissão de socorro. O delegado Valeriano Garcia Neto, que presidiu o inquérito, disse que agora a investigação seguirá para o Ministério Público de Alegrete, que fica a 500 quilômetros de Porto Alegre. A investigação criminal ocorre paralelamente ao inquérito instaurado pela Brigada Militar. Procurada, a Brigada Militar informa que o inquérito policial militar (IPM) que apura o caso ainda não foi encerrado e novas diligências foram solicitadas pelo comando do 2° RPMon. Assim que as investigações forem concluídas o seu resultado será divulgado.

Brasília (DF) - Entidades representativas do setor da comunicação social enviaram manifesto ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), onde defendem uma série de aspectos do projeto de lei de combate às chamadas “fake news” (PL 2630/20). As instituições destacam a necessidade de aplicação da legislação já existente no País e ressaltam a importância da valorização do jornalismo profissional - o que inclui a remuneração dos conteúdos jornalísticos digitais - e da publicidade nacional. Além disso, enfatizam a obrigatoriedade da liberdade com responsabilidade e transparência total das operações on-line, o que passa pela simetria da aplicação de regras às empresas que atuam como mídia, incluindo necessariamente as redes sociais, os aplicativos de mensagens e os motores de busca. Para as entidades, as melhores soluções de combate à desinformação passam pelos modelos de contratação de serviços de internet e não pela vigilância dos usuários, o que fere os princípios das liberdades de expressão e de imprensa. Nesse sentido, sugerem a aplicação da legislação para que as operações on-line sejam contratualmente realizadas no país e, portanto, identificados os patrocinadores, inclusive de propaganda política e partidária. No entendimento da coalizão, a venda de espaço publicitário e impulsionamento com intuito de atingir o mercado brasileiro tem de ser contratada no Brasil em acordo com as leis nacionais. A publicidade em meios digitais, segundo o documento endereçado a Maia, deve observar as regras de proteção à livre concorrência, em relação à utilização de tecnologias de processamento e análise de dados de usuários alcançados por publicidade direcionada. As instituições assinalam ainda a necessidade de obrigação de transparência na distinção de conteúdo noticioso, de conteúdo impulsionado e de publicidade, inclusive político-partidária. Assinam o documento 27 entidades, entre elas, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ).

Pelo mundo

Bielorrússia - Dezenas de jornalistas foram detidos e agredidos e tiveram equipamentos danificados por cobrirem protestos contra a reeleição do presidente Aleksandr Lukashenko, que declarou vitória em um pleito considerado fraudado e que pode não ser reconhecido pela União Europeia. Profissionais que passaram dias detidos revelam que policiais prenderam comunicadores, opositores de Lukashenko e até pessoas que passavam na rua no momento das manifestações de forma indiscriminada. A Associação de Jornalistas da Bielorrússia denuncia que, pelo menos 29 dos aproximadamente 68 repórteres e câmeras, detidos desde as eleições de 9 de agosto, foram agredidos. Todos já foram libertados, informa o Ministério do Interior ao Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ) que acompanha a situação.

Colômbia - O Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) solicitou às autoridades que investiguem com rapidez e transparência o assassinato do jornalista José Abelardo Liz, da rádio indígena Nación Nasa Estéreo, e determinem se militares do Exército estão ou não envolvidos no crime. Liz foi baleado e morto em13 de agosto durante uma ação militar para retirar membros do grupo indígena Nasa de terras próximas à cidade de Corinto, no oeste do país. O repórter filmava a ação quando foi atingido por três tiros. Imagens do último vídeo feito pelo jornalista foram usadas em reportagem sobre a ação militar produzida pela Nasa Estéreo e publicada no YouTube. Um segundo civil também foi morto, e outro ficou ferido, de acordo com as reportagens.

 China - Jimmy Lai, dono da Next Digital, editora do jornal Apple Daily, foi libertado em 11 de agosto após ficar um dia preso sob acusação de desrespeitar a lei de segurança nacional imposta em junho pela China. Além do jornal Apple Daily, Jimmy Lai é dono da revista Next Magazine, outra publicação pró-democracia e crítica ao governo de Pequim. Chamado de “traidor” pela imprensa estatal chinesa, Lai é acusado de ter impulsionado os protestos de 2019 e de conluio com uma potência estrangeira (por ter se reunido com o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, e com o secretário de Estado Mike Pompeo).

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Fontes: http://www.abi.org.br, https://www.abraji.org.br/, http://fenaj.org.br/,  https://www.conjur.com.br/areas/imprensa, http://www.portalimprensa.com.br/, http://artigo19.org/, https://portal.comunique-se.com.br/; https://www.coletiva.net/, Sociedade Interamericana de Imprensa (https://pt.sipiapa.org/contenidos/home.html), Federação Internacional de Jornalistas (www.ifj.org) (Bruxelas), Sindicato dos Jornalistas de Portugal (www.jornalistas.eu)(Lisboa), ONG Repórteres Sem Fronteiras (www.rsf.org) (Paris), Portal Comunique-se (portal.comunique-se.com.br), Comitê de Proteção aos Jornalistas (New York) (https://cpj.org/pt/), Centro Knight para o Jornalismo nas Américas(https://knightcenter.utexas.edu/pt-br/), ONG Campanha Emblema de Imprensa (PEC), Freedom House (www.freedomhouse.org), Associação Mundial de Jornais (www.wan-ifra.org), Fórum Mundial dos Editores e outras instituições e entidades de defesa do livre exercício da profissão de jornalista.

Pesquisa e edição Vilson Antonio Romero (RS)

e-mail: vilsonromero@yahoo.com.br


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