A LIBERDADE DE IMPRENSA NO BRASIL E NO MUNDO
Destaques: Profissionais sofrem agressões e ataques na BA, PI e SP. CDJOR repudia uso da ABIN para monitorar comunicadores. Fotógrafo perde a vida na Síria. RSF denuncia mais de uma dezena de mortes de jornalistas na América Latina.
NOTAS DO BRASIL
Salvador (BA) - O repórter Mateus Borges e o cinegrafista Tarcísio Lima, da Record TV Bahia, foram agredidos, na manhã de 25 de julho, durante a cobertura de um acidente envolvendo um carro e uma motocicleta, na Avenida Anita Garibaldi. A situação aconteceu ao vivo, durante o programa “Bahia no Ar”, quando dá para ver o momento em que eles são atingidos por socos. O agressor seria o marido da mulher que pilotava a motocicleta e ficou ferida no acidente. A equipe de reportagem não conseguiu o contato do suspeito. Foi registrado boletim de ocorrência e o caso é investigado pela Polícia Civil (PC).
Teresina (PI) - O repórter Denis Constantino, da TV Meio, foi atingido em 24 de julho com um tapa no rosto, desferido por uma mulher grávida, durante a cobertura de uma ocorrência policial. O jornalista registrava uma ação do Departamento de Repressão ao Narcotráfico (Denarc) e questionou a suspeita sobre entorpecentes apreendidos nas proximidades de sua residência. A mulher reagiu com hostilidade às perguntas do jornalista durante uma entrada ao vivo. Antes de ser colocada na viatura, a mulher já apresentava comportamento agressivo, fazendo gestos em direção à câmera. O tapa causou sangramento no rosto do repórter da TV Meio. A agressora negou qualquer envolvimento com as drogas encontradas.
Hortolândia (SP) - O jornalista André Azeredo, do SBT, foi intimidado e atacado verbalmente, na manhã de 22 de julho, ao fazer uma matéria sobre uma criança de dois anos atacada por um cão pitbull que pertencia à própria família. Ao chegar ao local, o padrasto da criança já ameaçou: “Se pisar na minha calçada, eu vou te agredir, parceiro. Porque é meu direito. Vem para cá para você ver”, afirmou. “Vou pular com os dois pés no seu peito. Atravessa essa linha imaginária. A reportagem vai ser sobre você e não sobre a minha filha”, acrescentou, em meio a outras expressões chulas e ofensivas. Ao entrar ao vivo no programa Alô Você, em seguida, André relatou de maneira muito tranquila os fatos e disse compreender o nervosismo do padrasto devido à tragédia, minimizando as agressões sofridas.
Cuiabá (MT) - O jornalista Alexandre Aprá, do site Isso é Notícia, foi absolvido pela 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do MT em ação por danos morais movida pelo ex-secretário da Casa Civil e suplente de senador, Mauro Carvalho. O político pedia uma indenização de R$ 15 mil por uma série de reportagens publicadas no site, que o vinculavam à compra de um jato com recursos públicos e sem licitação durante a pandemia. Em primeira instância, a Justiça já havia reconhecido que os textos não ultrapassaram os limites do exercício da liberdade de imprensa e estavam amparados pelo direito constitucional de informar. Em seu voto, na sessão de 23 de julho, a relatora desembargadora Anglizey de Oliveira destacou: “O autor, como agente público, está sujeito ao acompanhamento mais rigoroso por parte da imprensa e da sociedade, o que não caracteriza, por si só, abuso de direito”. Para ela, as reportagens de Isso É Notícia foram incisivas, mas não ofensivas.
Belo Horizonte (MG) – O Sindicato dos Jornalistas Profissionais de MG (SJPMG) e a Casa do Jornalista sofreram ameaças com mensagens de ódio e teor extremista em um pacote deixado na escadaria da sede da entidade em 22 de julho. A Polícia Militar e o Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) tiveram que ser mobilizados. Por mais de uma hora, os dirigentes e a secretária da entidade ficaram protegidos, na calçada da avenida Álvares Cabral, onde fica a sede do Sindicato, que, em 1980, sofreu um atentado à bomba, plantada por terroristas de extrema direita. O trabalho do esquadrão envolveu o uso de um robô que detecta a presença de bombas, entre outros artefatos próprios. Foi necessário também o trabalho de policiais paramentados com roupas contra explosão. Verificado o material no pacote, comprovou-se a inexistência de explosivo. O embrulho continha apenas pedras, além da provocação ao processo democrático brasileiro.
Palmas (TO) - O Jornal Opção foi criticado duramente pela Associação dos Servidores do Sistema Socioeducativo do Tocantins (Assoeto) em 23 de julho de 2025, em razão da reportagem “Descompasso entre servidores e realidade das unidades teria agravado crise na Secretaria de Cidadania e Justiça”, assinada pela jornalista Elâine Jardim. A entidade diz, em nota, que “o conteúdo da matéria representa um ataque injusto, irresponsável e sem fundamentos reais à categoria dos servidores do Sistema Socioeducativo”. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais (Sindjor) emitiu uma nota no dia seguinte rejeitando as críticas, pois a manifestação da entidade “ultrapassa o campo legítimo do contraditório e apresenta elementos que configuram tentativa de intimidação ao exercício profissional do jornalismo”.
Brasília (DF) - A Coalizão em Defesa do Jornalismo (CDJor), através de nota, repudiou o uso da estrutura da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para realizar monitoramento de jornalistas, veículos de imprensa e organizações da sociedade civil durante o governo anterior. Com a retirada do sigilo do relatório final da Polícia Federal (PF) por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), mais detalhes vieram à tona. De acordo com o documento, entre os jornalistas monitorados estão Ricardo Noblat, Alice Maciel, Leandro Demori, Mônica Bergamo, Reinaldo Azevedo e Vera Magalhães. Também foram citados veículos como Aos Fatos, Agência Lupa e revista piauí. A ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) — integrante da CDJor — também figura entre os monitorados.
São Paulo (SP) – A jornalista Juliana Dal Piva, repórter investigativa do Centro Latino-americano para Investigações Jornalísticas e colunista do ICL Notícias, foi agraciada pela Fundação Internacional de Mulheres na Mídia (IWMF) como uma das vencedoras do 36º Prêmio Coragem no Jornalismo. A iniciativa homenageia mulheres que, mesmo sob coação, “reportaram a verdade em seus países”, sendo esta a primeira vez que uma brasileira foi contemplada. Além de Juliana, foram premiadas as jornalistas Sana Atef, que opera sob um pseudônimo no Afeganistão; Yousra Elbagir, jornalista de radiodifusão internacional sudanesa-britânica; e Maritza L. Félix, fundadora de um serviço de notícias entre EUA e México. Já a jornalista azerbaijana Aynur Elgunesh, editora-chefe da Meydan TV, receberá o Prêmio Wallis Annenberg de Justiça para Mulheres Jornalistas, concedido anualmente a profissionais injustamente detidas, presas ou encarceradas. As vencedoras serão homenageadas em Nova York, Washington e Los Angeles, entre 10 de 18 de novembro.
Rio de Janeiro (RJ) – O repórter João Paulo Saconi, do jornal O Globo, lançou em 29 de julho, o livro “Vocês da Imprensa”, com registros e debates sobre a violência contra os jornalistas no Brasil. A obra registra parte dos ataques à imprensa desde 1998, ano em que a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) começou a fazer um levantamento anual sobre os ataques, mas se concentra no período de 2013 até 2024. O ponto de partida para a publicação foi uma experiência pessoal que Saconi viveu, aos 23 anos, no início da carreira. Há seis anos, escreveu uma reportagem que acabou incomodando apoiadores do governo anterior. Ao sentir na pele os efeitos da hostilidade, Saconi decidiu usar o trauma como ponto de partida para o debate desse tema.
São Paulo (SP) – O jornalista Vladimir Herzog, “in memoriam”, deve receber o título de Doutor Honoris Causa, concedido pela Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). Vlado, como era conhecido, foi assassinado pela ditadura militar em 1975. O título é concedido por instituições de ensino a pessoas que se destacaram em suas áreas de atuação. No caso de Herzog, por seu trabalho no jornalismo. A iniciativa partiu do Conselho do Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE), onde o jornalista lecionava a disciplina de Jornalismo Televisivo, quando foi morto.
São Paulo (SP) – O jornalista Leandro Demori, ex-editor executivo do The Intercept Brasil, teve uma queixa-crime ajuizada contra si pela editora Brasil 247, na 26ª Vara Criminal do Foro Central Criminal da Barra Funda. A ação por calúnia, injúria e difamação decorreu de manifestação em canal do YouTube onde acusa o site Brasil 247 de ter recebido dinheiro do Google para se opor ao Projeto de Lei 2.630/2020, conhecido como PL das Fake News: “Esse lobby que eles fizeram na época para não ter regulação de internet no Brasil (…). E botaram dinheiro na mão de sites progressistas, um deles foi o Brasil 247, né? Não gostaram na época que a gente falou isso, pode continuar não gostando, e vai depois desgostar de novo, e a vida que segue! Não tem problema nenhum! Receberam dinheiro do Google e acabaram defendendo uma pauta que é contra o Brasil, gente!”, disse o jornalista. O canal em que Demori fez essa declaração abriu espaço para o direito de resposta pedido pelo Brasil 247 e o departamento jurídico da editora notificou extrajudicialmente o jornalista, ajuizando posteriormente a queixa-crime. Foi designada, então, uma audiência de conciliação, mas o jornalista não compareceu, embora tenha sido devidamente intimado.
PELO MUNDO
França – A ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) denuncia que, entre janeiro e julho de 2025, pelo menos treze jornalistas foram assassinados na América Latina apenas por exercerem sua profissão e levarem informação de interesse público para as populações de seus países. Nesse período, a RSF registrou oito assassinatos no México, dois no Peru, um na Colômbia, um na Guatemala e um no Equador. A maioria das vítimas trabalhava em meios de comunicação locais ou comunitários e cobria temas sensíveis como corrupção, crime organizado e meio ambiente. Vários deles já haviam recebido ameaças ou eram alvo de campanhas de difamação. Dois jornalistas estavam sob proteção policial no momento de suas mortes. Embora investigações tenham sido abertas para a maioria desses crimes, muitos continuam sem solução, o que perpetua um clima de medo e prejudica o exercício do jornalismo.
Israel – A BBC, a Reuters, a Agência France-Press e a Associated Press alertaram, em comunicado conjunto de 24 de julho, que seus jornalistas correm o risco de morrer de fome em Gaza se Israel não permitir a entrada de alimentos suficientes no território. As agências enfatizaram que os jornalistas enfrentam muitas dificuldades em zonas de guerra, mas disseram estar “profundamente alarmadas com o fato de a ameaça de fome ser uma delas”. No comunicado pedem que Israel permita a entrada e saída de jornalistas em Gaza e a forneça “suprimentos alimentares adequados” aos moradores. Entre 7 de outubro de 2023 e 13 de julho de 2025, o Ministério da Saúde de Gaza informou que pelo menos 58 mil palestinos foram mortos e mais de 138 mil ficaram feridos.
EUA – O Comitê para a Proteção de Jornalistas (CPJ) e organizações parceiras pediram em 22 de julho ao Serviço de Imigração e Alfândega (ICE) que liberte o jornalista Mario Guevara, de Atlanta, que está preso desde 14 de junho, apesar da retirada de todas as acusações contra ele e de um juiz de imigração ter ordenado sua libertação sob fiança. Jornalista de língua espanhola e vencedor do Emmy, Guevara foi preso, acusado de reunião ilegal, obstrução, estar como pedestre em via pública reservada a automóveis, direção imprudente, desobediência aos sinais de trânsito e uso ilegal de dispositivo de telecomunicação, enquanto transmitia ao vivo um protesto "No Kings" contra o governo Donald Trump em um subúrbio de Atlanta. Todas as denúncias foram arquivadas por falta de provas. O jornalista vive legalmente nos EUA desde 2004. Ele fugiu de El Salvador naquele ano, depois de sofrer ameaças por seu trabalho como repórter político do jornal La Prensa Gráfica. Nos EUA, ele fundou o site MGNews e chegou a ganhar um Emmy em 2023.
Peru – A repórter Grecia Infante, do jornal La Republica, passou a ser ameaçada, juntamente com sua família, após publicação de reportagem na qual revela o mau estado de algumas locomotivas e vagões, desativados nos EUA após mais de 40 anos e trazidos ao Peru por Rafael Aliaga sem qualquer planejamento, e que estariam operando na linha Lima-Chosica. Em 18 de julho, a Prefeitura de Lima emitiu um comunicado acusando o La República e sua equipe jornalística de sabotar os trens. Depois dessa publicação, a jornalista recebeu ameaças de morte, assédio e tentativas de invasão de suas contas nas redes sociais.
Síria – O fotógrafo Sari Majid Al-Shoufi, do Suwayda 24, desapareceu na madrugada de 14 de julho, enquanto cobria confrontos armados na zona rural perto da cidade de Sweida, no sul do país. Sua morte foi confirmada em 24 de julho, após vários dias de buscas.
Peru - A Associação Nacional de Jornalistas do Peru (ANPl) registra que pelo menos 150 jornalistas e veículos de mídia sofreram ataques no primeiro semestre do ano, incluindo os assassinatos dos jornalistas Gastón Medina, em Ica, e Raúl Celis, em Iquitos.
Nicarágua – A Fundação para a Liberdade de Expressão e Democracia (FLED) revela, em relatório divulgado em 10 de julho, que, ao menos 293 profissionais da mídia deixaram o país por motivos de segurança ou foram exilados desde abril de 2018. O relatório, intitulado “Governo da Nicarágua Intensifica Assédio e Retaliação Contra Familiares de Jornalistas Exilados”, acrescenta que, entre abril e junho de 2025, a FLED documentou o exílio forçado de quatro jornalistas.
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A Associação Riograndense de Imprensa (www.ari.org.br) disponibiliza o correio eletrônico imprensalivre@ari.org.br aos profissionais e estudantes da comunicação social para as denúncias envolvendo atentados ao livre exercício da profissão de jornalista.
Fontes: ARI
(www.ari.org.br), ABI (www.abi.org.br), Fenaj (www.fenaj.org.br), ANJ
(www.anj.org.br), Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br),
Abert (www.abert.org.br), Abraji (www.abraji.org.br), Portal Imprensa
(www.portalimprensa.com.br), Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa
(www.liberdadedeimprensa.org.br), Portal Coletiva (www.coletiva.net), Portal
dos Jornalistas (https://www.portaldosjornalistas.com.br/), Jornalistas &
Cia (https://www.jornalistasecia.com.br/),
https://mediatalks.uol.com.br, Consultor Jurídico
(https://www.conjur.com.br/areas/imprensa), Sociedade Interamericana de
Imprensa (Miami), Federação Internacional de Jornalistas (www.ifj.org)
(Bruxelas), Sindicato dos Jornalistas de Portugal (www.jornalistas.eu)(Lisboa),
ONG Repórteres Sem Fronteiras (www.rsf.org) (Paris), Portal Comunique-se
(portal.comunique-se.com.br), Comitê de Proteção aos Jornalistas (Nova Iorque),
Centro Knight para o Jornalismo nas Américas (knightcenter.utexas.edu), ONG
Campanha Emblema de Imprensa (PEC), FreedomHouse (www.freedomhouse.org),
Associação Mundial de Jornais (www.wan-ifra.org), Comissão Interamericana de
Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA)
(http://www.oas.org/pt/cidh/), Fórum Mundial dos Editores,
https://forbiddenstories.org/, https://www.mfrr.eu/,
https://www.onefreepresscoalition.com/press e outras instituições e entidades
de defesa do livre exercício da profissão de jornalista.
Pesquisa e
edição: Vilson Antonio Romero (RS)
vilsonromero@yahoo.com.br