domingo, 28 de abril de 2024

BOLETIM 4 - ANO XIX - ABRIL DE 2024

  A LIBERDADE DE IMPRESA NO BRASIL E NO MUNDO

Destaques: Agência Pública recorre ao STF contra censura. Instituto Vladimir Herzog e Abert divulgam seus relatórios sobre ataques a comunicadores. Abraji revela mais de 600 processos contra a imprensa em todo o Brasil. Pistoleiros assassinam jornalista na Colômbia. Rússia mantém na prisão correspondente do Washington Post.
 
NOTAS DO BRASIL
São Paulo (SP) - A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) lançou em 24 de abril o “Monitor de Assédio Judicial contra Jornalistas no Brasil. O documento sistematiza as ações judiciais movidas contra os profissionais da imprensa que visam intimidar, fragilizar e silenciar o seu trabalho. A pesquisa revelou a existência de 654 processos que tramitam em varas de todo o país, focalizando 84 casos de assédio judicial. Os dados foram coletados, segundo a entidade, pelo registro de casos notórios, denúncias compartilhadas por jornalistas e organizações parceiras e a extração de processos por meio do acervo do Tribunal de Justiça de São Paulo. O documento está disponível em abraji.org.br.
 
Salvador (BA) - A Associação Bahiana de Cronistas Desportivos (ABCD) e o Sindicato dos Jornalistas local (Sinjorba) repudiaram, no início de abril, as hostilidades sofridas pela jornalista Samara Figueiredo, da TV Bahia, e pelo comunicador Antônio Neto, da ECB TV, na Arena Barradão, em 31 de março, durante o clássico Bahia x Vitória. Samara estava em uma das cabines de imprensa do estádio, quando torcedores do Vitória tentaram quebrar o vidro de proteção para tirar o produtor da cabine. Durante esta movimentação, a jornalista da Rede Bahia foi hostilizada verbalmente e com gestos obscenos. A Abraji também se solidarizou com os profissionais e exigiu apuração do ocorrido e melhores condições de trabalho para a imprensa no estádio baiano.
 
Ponta Grossa (PR) - A jornalista e blogueira Mareli Martins teve uma publicação retirada pela Meta de seu perfil no Facebook em 18 de abril. O conteúdo com o título “Povo propõe novas placas nas rodovias do PR: ´ratoeira em 500 metros, o pedágio é novo, mas o golpe é antigo´” foi publicado dois dias antes no blog e em seu perfil pessoal. O material trazia informações sobre a movimentação de um grupo, monitorado pela jornalista, que sugeriu a instalação de placas em rodovias com críticas ao sistema de pedágio no Estado. Mareli afirmou sentir-se prejudicada pela iniciativa da plataforma, uma vez que boa parte do conteúdo jornalístico que publica em seu blog é distribuído por meio de seus perfis nas redes sociais. SindijorPR, Sindijor Norte PR e a Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) se solidarizaram com a blogueira.
 
Brasília (DF) I - O repórter André Barrocal segue sendo processado pelo ex-procurador-geral da República, Augusto Aras, por conta de críticas a sua atuação publicadas na revista Carta Capital, em 7 de julho de 2020. Após ser derrotado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), Aras apelou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em maio de 2022, o STJ trancou a ação penal em “habeas corpus” impetrado pela defesa do jornalista, reconhecendo que “manifestações por parte da imprensa de natureza crítica, satírica, agressiva, grosseira ou deselegante não autorizam, por si sós, o uso do direito penal para, mesmo que de forma indireta, silenciar a atividade jornalística.” Aras busca agora reverter sua derrota por meio de uma reclamação constitucional perante o STF.
 
Brasília (DF) II – A Agência Pública segue sob censura por decisão da 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do DF que manteve a retirada do ar da reportagem, publicada em junho de 2023, sobre o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). Além de mencionar processos judiciais contra o parlamentar, a matéria trazia novas revelações da sua ex-esposa, Jullyene Lins, sobre fatos graves que teriam ocorrido no ano de 2006. A primeira turma do Supremo Tribunal Federal (STF) deve analisar recurso da agência.
 
Brasília (DF) III – Os jornalistas Alexandre Aprá e Enoch Cavalcanti se livraram, por decisão da ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, da busca e apreensão de celulares e computadores determinado pelo Tribunal de Justiça do MT. Os profissionais são os autores de reportagens e artigos de opinião sobre o desembargador Orlando Perri e sua relação com o governador Mauro Mendes (União Brasil). O político se sentiu ofendido pelas matérias por considerar que insinuavam relações ilícitas entre ele e Perri, e provocou a abertura de um inquérito policial em que foi determinada a operação policial que recolheu os aparelhos dos jornalistas. Embora a decisão da ministra seja definitiva, a investigação policial, em tese, pode continuar sem a apreensão dos celulares e a quebra dos sigilos. 
Cuiabá (MT) - Os repórteres Pablo Rodrigo, Victor Nunes, Benedito Albuquerque, Edina Araújo e Alexandre Aprá haviam sido indiciados em um inquérito policial instaurado a partir de uma notícia-crime apresentada por Luiz Antônio Taveira Mendes, filho do governador Mauro Mendes. A motivação era uma reportagem sobre a Operação Hermes, da Polícia Federal, que envolvia o filho do governador, motivando, inclusive, um pedido de prisão preventiva contra ele. A alegação da defesa é de falsidade da notícia e que sua divulgação atentaria contra a honra de Luiz Antônio. O Ministério Público do MT (MPMT) destacou que, por se tratar de uma alegação de crime contra a honra, não caberia à polícia ou o MPMT a responsabilidade de levar adiante a investigação do caso. Segundo o Código Penal, a própria vítima deve entrar com uma ação penal privada, dentro de um prazo de 6 meses. Caso fique comprovado que a defesa de Mendes não ingressou com essa ação, a promotoria pediu que fosse declarada a extinção de punibilidade dos indiciados. 
 
Belém (PA) – O Instituto Vladimir Herzog divulgou em 23 de abril o estudo “Fronteiras da Informação – Relatório sobre jornalismo e violência na Amazônia”, objetivando alertar a sociedade sobre a relação de crimes contra o meio ambiente e a violência contra jornalistas na Amazônia. O material traça um panorama sobre a situação na região amazônica, palco de crescente onda de violência, atingindo diretamente os profissionais de imprensa, se baseando em dados da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) que revelam a ocorrência de 230 casos de violência contra a imprensa nos nove estados da região, nos últimos dez anos. Segundo a entidade, o Pará é o estado mais violento para repórteres na região, com 89 casos registrados em uma década, seguido por Amazonas (38) e Rondônia (20).
 
Maceió (AL) - O portal 082 Notícias pode manter no ar a matéria “Prefeitura celebra ‘orgia carnavalesca’ enquanto maceioenses padecem sem os serviços básicos”, publicada em 12 de abril, que havia sido censurada por liminar da juíza Isabelle Sampaio, da 30ª Vara Cível, concedida a pedido do prefeito JHC (PL). O ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou a decisão de primeira instância, argumentando que “as liberdades de expressão e de informação foram indevidamente restritas por liminar do Poder Judiciário, sem a devida fundamentação”. Na decisão, o ministro Zanin afirma que o texto do 082 Notícias não tem fatos falsos. “Por outro ângulo, verifico que existe interesse jornalístico no relato em questão, pois se refere à utilização de recursos da Prefeitura, com eventos culturais fora de seu território”, destaca o ministro.
 
Brasília (DF) IV - A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) apresentou em 4 de abril, a edição 2023 de seu “Relatório sobre Violações à Liberdade de Expressão”. A entidade, no ano passado, contabilizou 111 casos de violência não letal contra pelo menos 163 jornalistas e veículos de comunicação. Os números apontam que a cada três dias a imprensa brasileira sofreu algum tipo de ataque em 2023. Os casos de atentado, injúria e furtos contra profissionais cresceram, respectivamente, 50%, 200% e 600% em relação a 2022. O documento também destacou o assassinato de Thiago Rodrigues, profissional de comunicação morto em Vicente de Carvalho (SP) após receber ameaças por denúncias publicadas em seu blog sobre irregularidades no município e na gestão política da região. Desde 2012, quando a Abert começou a apurar os casos de violências sofridas por jornalistas brasileiros, foram registrados 26 assassinatos de profissionais da imprensa. Apenas em 2019 e 2021 não houve esse tipo de ocorrência.
 
PELO MUNDO
Colômbia I – O jornalista e líder comunitário Jaime Vásquez foi assassinado a tiros na manhã de 14 de abril em La Riviera, região de Cúcuta. Imagens de câmeras de segurança mostram o momento em que ele foi atacado por pistoleiros, com três disparos fatais. O presidente Gustavo Petro condenou o assassinato e pediu ao Ministério Público que realize “a investigação mais aprofundada”.
 
Argentina – O jornalista Julio Ernesto López recebeu ameaças de morte após a transmissão de 4 de abril no programa Telenoche do Canal Trece de uma reportagem sobre a venda ilegal de medicamentos controlados. López apresentou à Promotoria Especial para a Investigação de Crimes Cibernéticos em Buenos Aires as mensagens postadas pelo WhatsApp no celular de seu pai.  As ameaças do gênero “Vou atirar em você” e “Cara caolho, você trabalha para a polícia” focam em López, que usa lentes sombreadas no olho esquerdo, acredita que as ameaças foram enviadas para o telefone de seu pai porque tem o mesmo nome. Na matéria, o repórter explicou como os criminosos acessam o sistema on-line do Instituto Nacional de Serviços Sociais para Aposentados e Pensionistas (PAMI), a agência pública de seguro de saúde para aposentados, para emitir receitas de medicamentos que são subsidiados em média 80% pelo governo. López é mostrado negociando um pagamento com um criminoso para ter acesso ao sistema.
 
Peru – O jornalista investigativo Gustavo Gorriti, editor-chefe do IDL -Reporteros, está sendo acusado de ter “subornado” dois promotores públicos, promovendo-os em troca de notícias exclusivas. O promotor público de Lima, Alcides Chinchay, abriu uma investigação preliminar contra Gorriti, que declarou ao Comitê de Proteção a Jornalistas (CPJ) que suas interações com os promotores constituem uma relação normal entre um jornalista e suas fontes, e qualificou o inquérito de “absurdo”. O jornalista foi o responsável por revelar a corrupção praticada pela Odebrecht em países da América Latina.
 
Rússia – O jornalista americano Evan Gershkovich, do Washington Post, deve permanecer preso na Rússia, depois que o Primeiro Tribunal de Apelações de Jurisdição Geral de Moscou rejeitou em 23 de abril o recurso contestando a quinta prorrogação de sua prisão preventiva. O repórter foi preso em 29 de março de 2023 quando fazia uma reportagem sobre a indústria russa de armas na região dos Montes Urais. Em março deste ano, a justiça decretou a quinta prorrogação da prisão preventiva. Desde o início, o caso foi visto como um ato da Rússia para negociar uma troca de prisioneiros, como já feito em situações anteriores. O presidente Vladimir Putin já confirmou em entrevista essa possibilidade, mas as negociações ainda não chegaram a uma conclusão.
 
Inglaterra - O conglomerado de mídia News Corp., do bilionário australiano Rupert Murdoch, segue fazendo acordos judiciais com os atingidos pelo escândalo dos grampos telefônicos ocorrido há mais de uma década. Os valores já atingem 1 bilhão de libras (US$ 1,24 bilhão) em indenizações desde que o escândalo estourou, e quando o grupo admitiu as escutas telefônicas para obter histórias a serem publicadas no News of the World —levando ao encerramento do jornal, a um inquérito público e a uma investigação policial. Em 2007, a Justiça condenou à prisão o correspondente do jornal para assuntos da realeza Clive Goodman e o investigador Glenn Mulcaire devido ao grampo ilegal de telefones de membros da família real. A Scotland Yard iniciou uma nova investigação em janeiro de 2011, após alegações de que milhares de pessoas, entre elas atores, políticos, jogadores de futebol, apresentadores de TV e outras celebridades, tiveram seus telefones interceptados ilegalmente. Em abril daquele ano, o tabloide admitiu publicamente pela primeira vez ter interceptado mensagens deixadas na caixa postal de celulares de pessoas envolvidas em casos acompanhados pelo jornal.
 
Colômbia II – Os repórteres de emissoras como RTVC, Juan Maza BQ, El Tiempo, Cofradía para el Cambio, Tras Este Visor e El Tamal News foram vítimas de agressões físicas e verbais, obstrução do trabalho jornalístico e ameaças durante a cobertura dos protestos de 21 de abril, em diversas localidades. Os jornalistas foram tachados de “jornalistas vendidos”, “provocadores”, “esquerdistas” e, em alguns casos, acusados de manipular informações sobre a manifestação. Oito jornalistas foram agredidos com garrafas, latas, água e outras substâncias atiradas contra eles durante a cobertura. Em um caso documentado em Barranquilla, a fotógrafa Vanessa Romero e o âncora Deivis López, do El Tiempo, foram abordados por um homem que tentou impedir sua transmissão ao vivo. Quando se recusaram, o homem empurrou e quebrou o crachá do apresentador. Uma situação semelhante foi vivida pela correspondente da RTVC em Atlántico, Sayni Elisa Agámez, quando ela foi cercada e uma pessoa puxou seu cabelo e bateu em seu braço.
 
Cuba - A jornalista Camila Acosta, do CubaNet, foi detida em 21 de abril em Cárdenas, província de Matanzas, por ordens da Segurança do Estado enquanto se dirigia para visitar parentes de presos políticos. Acosta permaneceu retida em uma delegacia em Cárdenas por uma hora e depois levada até sua residência em Havana escoltada por várias patrulhas.
 
Paraguai - A Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) alertou em 19 de abril sobre os casos de criminalização judicial contra o exercício jornalístico e as ameaças enfrentadas por repórteres e comunicadores em função das denúncias realizadas em seu trabalho. A entidade também mencionou que vários promotores e advogados exigiram conhecer a identidade dos jornalistas que publicaram informações sobre o ex-presidente Horacio Cartes (2013-2018). A publicação se refere a uma ampliação da denúncia solicitada por Cartes em outubro de 2023, após uma petição inicial apresentada em julho do ano passado, relacionada a uma suposta 'perseguição' contra ele.
 
Itália – Os repórteres Giovanni Tizian, Nello Trocchia, Stefano Vergine, do jornal Domani, podem ser presos por reportagens envolvendo um ministro do governo da primeira-ministra Giorgia Meloni. Eles são acusados de terem solicitado e recebido documentos confidenciais de um funcionário público e publicado notícias com base neles, o que o jornal e as entidades contestam.
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A Associação Riograndense de Imprensa (www.ari.org.br) disponibiliza o correio eletrônico imprensalivre@ari.org.br aos profissionais e estudantes da comunicação social para as denúncias envolvendo atentados ao livre exercício da profissão de jornalista.
 
 Fontes: ARI (www.ari.org.br), ABI (www.abi.org.br), Fenaj (www.fenaj.org.br), ANJ (www.anj.org.br), Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br), Abert (www.abert.org.br), Abraji (www.abraji.org.br), Portal Imprensa (www.portalimprensa.com.br), Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa (www.liberdadedeimprensa.org.br), Portal Coletiva (www.coletiva.net), Portal dos Jornalistas (https://www.portaldosjornalistas.com.br/), Jornalistas & Cia (https://www.jornalistasecia.com.br/),  https://mediatalks.uol.com.br, Consultor Jurídico (https://www.conjur.com.br/areas/imprensa), Sociedade Interamericana de Imprensa (Miami), Federação Internacional de Jornalistas (www.ifj.org) (Bruxelas), Sindicato dos Jornalistas de Portugal (www.jornalistas.eu)(Lisboa), ONG Repórteres Sem Fronteiras (www.rsf.org) (Paris), Portal Comunique-se (portal.comunique-se.com.br), Comitê de Proteção aos Jornalistas (Nova Iorque), Centro Knight para o Jornalismo nas Américas (knightcenter.utexas.edu), ONG Campanha Emblema de Imprensa (PEC), FreedomHouse (www.freedomhouse.org), Associação Mundial de Jornais (www.wan-ifra.org), Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) (http://www.oas.org/pt/cidh/), Fórum Mundial dos Editores, https://forbiddenstories.org/, https://www.mfrr.eu/, https://www.onefreepresscoalition.com/press e outras instituições e entidades de defesa do livre exercício da profissão de jornalista.
Pesquisa e edição: Vilson Antonio Romero (RS)
vilsonromero@yahoo.com.br

terça-feira, 2 de abril de 2024

BOLETIM 3 - ANO XIX - MARÇO DE 2024

 A LIBERDADE DE IMPRESA NO BRASIL E NO MUNDO

Destaques: Abraji divulga monitoramento de ataques a jornalistas. Juiz de SP rejeita denúncia contra profissionais que noticiaram tiroteio em Paraisópolis. Internacional demite ator que importunou repórter durante Gre-Nal. Tribunal londrino mantém possibilidade de Julian Assange recorrer contra extradição para os EUA. Governo argentino intensifica ataques à imprensa. Al-Jazeera denuncia violência contra seu correspondente na Faixa de Gaza.

NOTAS DO BRASIL

São Paulo (SP) I – A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) divulgou em 26 de março o relatório de 2023 do Monitoramento de Ataques a Jornalistas, feito em parceria com a rede Voces Del Sur, formada por organizações de 17 países da América Latina e do Caribe. No ano passado, foram registrados 330 ataques aos jornalistas, numa redução de 40,7% em relação ao último ano do governo anterior (557 ataques). Os dados foram apresentados pela pesquisadora Rafaela Sinderski que destacou mudanças na natureza dos ataques e a redução dos casos, embora não representem, segundo ela, um contexto mais seguro para a imprensa. Em 2023, os discursos estigmatizantes representaram 47,2% dos ataques registrados. Este tipo de agressão está ligado a estratégias de descredibilização da imprensa, comumente iniciadas, incitadas e propagadas por atores políticos, sobretudo em ambientes digitais. 52,1% dos casos coletados aconteceram on-line, especialmente aqueles direcionados a mulheres, que têm grande repercussão nas redes. Ao longo dos últimos quatro anos, atores estatais  foram os autores da maioria dos ataques: em 2023, estiveram envolvidos em 55,7% dos casos. Além disso, a proporção de agressões físicas aumentou, alcançando 38,2%, contra os 31,2% de 2022. Os atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 tiveram reflexo direto nesses resultados, já que muitos jornalistas foram atacados durante a cobertura do episódio, sofrendo violência física, ameaças, intimidações e destruição de seus equipamentos.

Brasília (DF) I - O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), acolheu o pedido da Abraji de se tornar “amicus curiae” no tema de repercussão geral 995, cujo texto responsabiliza os meios de comunicação por declarações de seus entrevistados. A Abraji ingressou com o pedido junto com embargos declaratórios, acompanhados de uma nota técnica da entidade, em conjunto com Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj), Repórteres Sem Fronteiras (RSF), Associação de Jornalismo Digital (Ajor), Instituto Palavra Aberta, Instituto Vladimir Herzog e Tornavoz.

São Paulo (SP) II - O juiz Antonio Zorz, da 1ª Zona Eleitoral de SP, rejeitou em 15 de março a denúncia oferecida pelo Ministério Público Estadual (MPSP) contra os jornalistas Artur Rodrigues, do jornal Folha de S.Paulo, e Joaquim Carvalho, do portal Brasil 247, pela publicação de reportagens sobre o tiroteio ocorrido em Paraisópolis, zona sul paulistana, durante uma agenda do então candidato a governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), na campanha eleitoral de 2022. A reportagem da Folha mostrou que a equipe de Tarcísio mandou um cinegrafista apagar o vídeo do tiroteio, que acabou com um suspeito morto com um tiro no peito em confronto com a Polícia Militar (PM), em outubro daquele ano. Depois disso, um advogado pediu investigação ao MPSP acusando Tarcísio e seu staff de forjarem um atentado durante a agenda de campanha. Sem provas contra o governador, o promotor Fabiano Petean, da 1ª Zona Eleitoral, pediu o arquivamento da denúncia sobre a equipe de governador e, no mesmo documento, defendeu que os jornalistas fossem investigados por suposta divulgação de informações falsas. Neste mês, o promotor denunciou os dois, alegando que eles “divulgaram reportagens discrepantes da realidade” e que “sabiam inverídicas”.

Teresina (PI) - Por entender que não havia ato ilícito e, consequentemente, nenhum dever de reparação, o juiz Teófilo Ferreira, da 3ª Vara Cível, julgou improcedente a ação de danos morais do jornalista José de Arimateia Azevedo contra a revista eletrônica Consultor Jurídico (ConJur) e três de seus jornalistas. Arimateia foi objeto de uma série de reportagens sobre a sua atuação no Portal AZ. Os textos informavam que ele teria coagido uma advogada, usado certidões falsas para firmar negócios com o governo do PI e sua condenação por estelionato. Ao decidir, o magistrado explicou que para que seja configurada a responsabilidade civil é indispensável a caracterização de quatro elementos: a conduta ilícita, o resultado, o nexo entre eles e a culpa “lato sensu”. “Entretanto, não vislumbro o primeiro requisito para configurar a indenização pretendida nestes autos. Nesse contexto, em análise a documentação acostada em petição, resta-se comprovado que não existe ato ilícito gerador do dever de reparação. Assim, tendo em vista a não verificação de um dos requisitos para a configuração da responsabilidade civil, a pretensão indenizatória não merece prosperar”, resumiu.

Londrina (PR) - A jornalista Célia Musilli, do jornal Folha de Londrina, sofreu ataques de dirigentes partidários e simpatizantes do governo estadual, após publicar texto criticando a censura ao livro “O Avesso da Pele”. Escreveu ela: “é estarrecedora a notícia de que uma obra que integra o Programa Nacional do Livro (PNLD) – que compra e distribui livros didáticos para a rede pública do País – e que é indicada aos alunos do Ensino Médio, passe por esse tipo de filtro constrangedor, numa indicação de que estamos dando marcha à ré, em vez de avançar no entendimento do que é literatura e do que é educação”. O Sindicato dos Jornalistas do Norte do PR (Sindijor Norte PR) divulgou nota em apoio à profissional

Brasília (DF) II - O Sindicato dos Jornalistas Profissionais de SP (SJSP) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) ingressaram como ​​“amicus curiae” em uma Reclamação Constitucional ao Supremo Tribunal Federal (STF) ajuizada pela defesa do jornalista Breno Altman. Os advogados de Altman requerem a suspensão de todas as decisões judiciais que autorizaram a exclusão de postagens jornalísticas na internet de sua autoria, com críticas ao Estado de Israel e à ideologia política do sionismo. Na petição ao STF, as entidades alegam que a Confederação Israelita do Brasil (Conib) realizou verdadeiro “assédio judicial” com a série de ações contra Altman, na tentativa de intimidar e censurar o trabalho do profissional, o que fere a liberdade de imprensa e a livre atuação jornalística.

Porto Alegre (RS) – Gustavo Astarita, que interpretava o Saci, mascote do Sport Club Internacional, admitiu, em depoimento à polícia, que beijou a repórter Gisele Kumpel, da rádio Monumental, à força após um dos gols no Gre-Nal disputado no Estádio Beira-Rio em 25 de fevereiro. Astarita, em razão do indiciamento por importunação sexual à profissional e à uma torcedora, foi demitido pelo clube em 14 de março, após a conclusão do inquérito policial, no qual a 1ª Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM) denuncia o crime contra as mulheres.

PELO MUNDO

Inglaterra - O Tribunal Superior de Londres decidiu em 26 de março a favor do fundador do portal WikiLeaks, jornalista Julian Assange, permitindo que ele continue contestando a decisão sobre a sua extradição para os EUA nos tribunais do Reino Unido. “O Tribunal Divisional considera que o sr. Assange tem uma perspectiva real de sucesso em três dos nove fundamentos de recurso [fundamentos iv), v) e ix)]. Deu ao governo dos EUA e ao secretário de Estado a oportunidade de oferecer garantias que abordariam esses fundamentos de recurso. A menos que sejam fornecidas garantias satisfatórias, o tribunal concederá autorização para recorrer desses fundamentos. O tribunal recusa o recurso com base nos outros seis fundamentos [i), ii), iii), vi), vii) e viii)] que não têm qualquer mérito”, diz a decisão do tribunal. Os dois juízes responsáveis pela decisão querem que os EUA forneçam “garantias” sobre duas questões essenciais: se Assange vai poder invocar a Primeira Emenda da Constituição norte-americana, uma vez que sua defesa considera que Assange estava protegido pela liberdade de imprensa quando divulgou os documentos sobre as operações dos EUA nas guerras do Iraque e do Afeganistão; e se ele corre risco de enfrentar a pena de morte uma vez que seja julgado em solo norte-americano. A próxima audiência foi agendada para 20 de maio, caso as partes apresentem os documentos necessários para o andamento dos trabalhos. Julian Assange, cidadão australiano, foi transferido para a prisão de segurança máxima de Belmarsh, em Londres, em abril de 2019. Nos EUA, ele enfrenta acusação de espionagem por divulgar informações confidenciais que lhe foram fornecidas por Chelsea Manning em 2010. Os documentos referenciam alegados crimes de guerra dos EUA durante as invasões e ocupação do Afeganistão e do Iraque. Se for condenado, o fundador do WikiLeaks poderá pegar 175 anos de prisão.

Rússia – O correspondente do Wall Street Journal, Evan Gershkovich, teve sua prisão preventiva prorrogada até 30 de junho, por decisão de um tribunal de Moscou em 26 de março. Evan foi capturado em março de 2023 quando fazia uma reportagem na região dos Montes Urais, sobre um complexo militar russo. Filho de soviéticos que moram nos EUA, Gershkovich já trabalhou em veículos como The Moscow Times e New York Times, sendo o primeiro jornalista americano preso pela Rússia sob acusação de espionagem desde a Guerra Fria. O Wall Street Journal, o governo dos EUA e organizações de liberdade de imprensa criticam a detenção de Gershkovich e a falta de transparência nos procedimentos legais envolvendo o caso. 

Israel - A rede Al Jazeera, com sede no Qatar, denunciou as forças israelenses por prender e espancar em 17 de março, no Hospital AL-Shifa, o jornalista Ismail al-Ghoul, um de seus correspondentes na cidade de Gaza. O profissional se encontrava no local com outros repórteres para cobrir um novo ataque do exército israelense. Alegando que membros do Hamas usam os hospitais de Gaza para se refugiar, as forças israelenses têm feito recorrentes operações militares nestes locais. Há relatos de que milhares de civis, incluindo equipes médicas, pacientes e suas famílias, estão sendo mantidos presos no al-Shifa por conta dessas operações. Ainda de acordo com a Al Jazeera, seu correspondente foi arrastado no centro médico por membros das forças israelenses, que também destruíram os veículos de transmissão das equipes de notícias. A rede árabe exigiu a libertação imediata de al-Ghoul. Citando as mortes de jornalistas veteranos que trabalhavam para a empresa, como Shireen Abu Akleh, Samer Abu Daqqa e Hamza Dahdouh, e o bombardeio de seu escritório em Gaza, o texto também afirmou que as agressões e a detenção de al-Ghoul integram uma série de ataques à rede com sede no Qatar, cujo posicionamento editorial é abertamente crítico a Israel.

Argentina I - O jornalista Nelson Castro, da emissora TN, enviado à cidade de Rosario para cobrir a onda de violência do narcotráfico, foi ameaçado de morte em 11 de março, logo que desembarcou na localidade. “Diga a ele que se chegar a Seguí y Oroño, vamos tirá-lo, quem avisa não trai, que vá embora de Rosario, não os queremos aqui. Atenciosamente, a Máfia”. Esta mensagem foi recebida pelo repórter Sebastián Domenech, acompanhada de uma captura de tela na qual se vê Castro indo ao ar pela TN de Rosario.

Argentina II - A pesquisa realizada pelo Monitoramento da Liberdade de Expressão do Fórum Argentino de Jornalismo (Fopea) denuncia que, quatro em cada 10 ataques à imprensa, entre 10 de dezembro de 2023 e 19 de março de 2024, envolveram o presidente Javier Milei ou seus ministros. O Fopea registra 37 ataques, dos quais 15 tiveram o Poder Executivo como agressor. A análise especifica também que oito desses 15 episódios foram protagonizados pelo próprio presidente e dois pelo seu porta-voz, Manuel Adorni.

Congo – O jornalista Stanis Bujakera, da Jeune Afrique e agência Reuters, foi libertado em 19 de março. Ele havia sido condenado a seis meses de prisão por disseminar informações falsas, entre outras acusações. O promotor havia pedido pena de 20 anos de reclusão, mas foi rejeitado pelo tribunal. Stanis foi considerado culpado de "fabricar e divulgar" um "documento falso" dos serviços de inteligência incriminando outro serviço de segurança no assassinato de um opositor político. A ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) alega que o processo foi baseado em acusações espúrias. Ele estava em prisão preventiva desde 8 de setembro de 2023.

Argentina III - O guia “Violência e assédio digital. Ferramentas de ação para jornalistas”, iniciativa do Unicef, UNFPA, PNUD e ONU Mulheres, entidades das Nações Unidas de promoção e proteção dos direitos humanos e da igualdade de gênero, foi lançado em 14 de março. O documento apresenta ações para tornar visíveis os ataques preconceituosos de gênero contra mulheres jornalistas que impactam o exercício da liberdade de expressão e afetam a qualidade das democracias. Segundo as entidades “o material constitui um ponto de partida não só para sensibilizar para esta problemática, mas também para promover a construção de um mundo digital livre de discriminação e violência de gênero. Neste caminho, reafirmamos o nosso compromisso com a defesa da liberdade de imprensa e da segurança das mulheres jornalistas no exercício da sua profissão.”

México - O jornalista Jaime Barrera, da Televisa Guadalajara e do jornal El Informador, foi libertado em 12 de março, depois de passar mais de 24 horas refém de um grupo de criminosos. No dia anterior, ao sair da emissora aonde trabalha, Barrera estava indo jantar com os filhos quando apareceram os homens armados que o tiraram do carro e o colocaram no banco de trás de outro veículo para que ele não pudesse ver para onde estava indo. “Fiquei em cativeiro com os olhos vendados, com as mãos amarradas, ajoelhado em um lugar onde não dava para ver a maior parte do tempo, e depois prostrado, com um pouco de água”. Os seqüestradores o libertaram na estação de ônibus, no município de Magadalena, estado de Jalisco, onde membros da Guarda Nacional chegaram e o ajudaram a voltar para casa. Ele suspeita que o ocorrido seja somente um aviso que possa estar relacionado ao seu trabalho como jornalista, pois não pediram resgate.

El Salvador - A Associação de Jornalistas de El Salvador (Apes) denunciou em 5 de março pelo menos 319 ataques contra a imprensa nas últimas eleições. Dados do Centro de Monitoramento Eleitoral da Apes indicam que foram registradas 224 violações nas eleições presidenciais e legislativas de 4 de fevereiro e 95 nas eleições municipais e do Parlamento Centro-Americano (Parlacen) de 3 de março. A presidente da associação, Angélica Cárcamo, manifestou em coletiva de imprensa a sua preocupação com “a falta de interesse no diálogo para evitar este tipo de situação” por parte do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Argentina IV – O governo fechou a agência de notícias oficial Télam, a mais importante do país. A sede amanheceu lacrada e cercada pela polícia em 4 de março. Os cerca de 700 funcionários da estatal foram comunicados por e-mail de sua dispensa, sem terem recebido nenhuma informação sobre o que ocorrerá após o fim da dispensa, mas afirmaram suspeitar de uma privatização. Nenhum decreto acompanha as medidas, que também não foram anunciadas no diário oficial do país. Como único argumento para o fechamento, Milei destacou que considerava que a agência “tem sido utilizada nas últimas décadas como uma agência de propaganda kirchnerista”, a mesma justificação usada pelo ex-secretário de Comunicação Social Pública, Hernán Lombardi, quando foram feitas 357 demissões.

Uruguai - O Centro de Arquivo e Acesso à Informação Pública (Cainfo) manifesta a sua preocupação com a investigação interna do Ministério do Interior para descobrir as fontes do jornalista Eduardo Preve, da rádio M24, nas reportagens sobre a utilização do dispositivo conhecido como “El Guardian” e outros casos envolvendo a polícia. Os trabalhos teriam sido realizados pela Direção Nacional de Investigações da Polícia Nacional, e não foram solicitados pelo Ministério Público. Por outro lado, o episódio é do conhecimento do Ministro do Interior Nicolás Martinelli desde 9 de novembro de 2023. A investigação incluiu o acesso ao arquivo do jornalista no Sistema de Gestão de Segurança Pública, a busca de possíveis informantes e as ligações que ele fez e recebeu por meio de seu telefone móvel. Também foram pesquisadas as publicações da Preve nas redes sociais em relação a uma notícia divulgada pela rede social sobre o assassinato de Cecilia Fontana de Heber em 1978.

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A Associação Riograndense de Imprensa (www.ari.org.br) disponibiliza o correio eletrônico imprensalivre@ari.org.br aos profissionais e estudantes da comunicação social para as denúncias envolvendo atentados ao livre exercício da profissão de jornalista. 

Fontes: ARI (www.ari.org.br), ABI (www.abi.org.br), Fenaj (www.fenaj.org.br), ANJ (www.anj.org.br), Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br), Abert (www.abert.org.br), Abraji (www.abraji.org.br), Portal Imprensa (www.portalimprensa.com.br), Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa (www.liberdadedeimprensa.org.br), Portal Coletiva (www.coletiva.net), Portal dos Jornalistas (https://www.portaldosjornalistas.com.br/), Jornalistas & Cia (https://www.jornalistasecia.com.br/),  https://mediatalks.uol.com.br, Consultor Jurídico (https://www.conjur.com.br/areas/imprensa), Sociedade Interamericana de Imprensa (Miami), Federação Internacional de Jornalistas (www.ifj.org) (Bruxelas), Sindicato dos Jornalistas de Portugal (www.jornalistas.eu)(Lisboa), ONG Repórteres Sem Fronteiras (www.rsf.org) (Paris), Portal Comunique-se (portal.comunique-se.com.br), Comitê de Proteção aos Jornalistas (Nova Iorque), Centro Knight para o Jornalismo nas Américas (knightcenter.utexas.edu), ONG Campanha Emblema de Imprensa (PEC), FreedomHouse (www.freedomhouse.org), Associação Mundial de Jornais (www.wan-ifra.org), Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) (http://www.oas.org/pt/cidh/), Fórum Mundial dos Editores, https://forbiddenstories.org/, https://www.mfrr.eu/, https://www.onefreepresscoalition.com/press e outras instituições e entidades de defesa do livre exercício da profissão de jornalista.

Pesquisa e edição: Vilson Antonio Romero (RS)

vilsonromero@yahoo.com.br

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